edifício da
ANACOM, onde nasceu a radiodifusão pública - Emissora Nacional
Palavras-chave: arquivístico, biblioteconómico, comunicações,
correios, edificado, imaterial, móvel, património, Portugal, radiocomunicações,
telefonia, telegrafia, museológico
As comunicações organizadas constituem um dos
fatores mais relevantes das civilizações. Permitiram e permitem a troca e
a difusão do pensamento, cultura, ciência, arte, economia e informação sobre tudo
o que se passa no mundo, incluindo meteorologia, condições para a prática de
agriculturas, telemedicina, exploração do espaço celeste, navegabilidade
náutica/aérea, transportes terrestres...
As comunicações estiveram presentes nas viagens
dos Descobrimentos, no conhecimento e exploração dos continentes, na relação
com os povos e nas trocas de produtos. Continuam a estar presentes, quer na
forma tradicional de escrita, quer na forma telefónica, telegráfica, dados,
vídeo e televisão.
Nos últimos 20 anos, o setor das comunicações
foi o que mais cresceu. A evolução até ao estádio da digitalização foi lenta.
Algumas tecnologias não passaram de experimentais, mas outras houve que duraram
décadas ou séculos, tal como o transporte das mensagens em suporte físico.
O correio começou por ser transportado por
mensageiros a pé. A maratona, por exemplo, foi um episódio de corrida numa
extensão de 42 km para que Feidípedes
entregasse a mensagem da vitória dos Gregos sobre os Persas. Estávamos no ano
de 490 antes de Cristo. De tão dura prova para transportar a correspondência, o
mensageiro morreu logo após a missão da entrega. Deixou-nos, porém, uma marca
cultural. A maratona é hoje uma prova de desporto de alta competição. Muitos
outros mensageiros anónimos arriscaram e deram a vida para “entregar a carta a
Garcia”.
Aos correios privativos dos reis, senhores,
conventos, bispos e instituição papal, sucederam-se os correios públicos, com
uso de novos meios de transportes, organização e tecnologias. Até os pombos-correios foram
aproveitados para o transporte físico de columbogramas, especialmente no
ambiente militar, em que era demasiado arriscado ou mesmo impossível o
transporte por via terrestre.
As telecomunicações começaram com o uso do fogo,
fumos e sons, evoluindo para a transmissão de sinais e mensagens elaboradas
através da telegrafia visual, com auxílio de instrumentos óticos, para captarem
os sinais a longas distâncias.
Com a descoberta da eletricidade e o invento dos
meios de armazenar a energia em pilhas e baterias, as telecomunicações puderam
chegar até aos confins do mundo; primeiro com a utilização de fios elétricos,
seguiram-se os cabos de cobre e fibra ótica. Mas onde não havia fios nem cabos
também o homem e a ciência conseguiram contornar as dificuldades. Hertz e Marconi, para
apenas referir dois nomes, foram determinantes na desmaterialização das
transmissões, aplicando a via radioelétrica entre os percursos.
O desenvolvimento das tecnologias de comutação
(isto é a possibilidade de troca de mensagens entre os muitos e diferentes
números de assinantes do serviço de telecomunicações) também se sucedeu,
primeiro com a intervenção de Telefonistas, na era da comutação manual; depois
com os vários sistemas automáticos eletromecânicos e atualmente com os sistemas
de tecnologia digital.
O Museu das Comunicações com patrimónios dos
CTT, PT (e as empresas nelas fundidas), a ANACOM – Autoridade Nacional de
Comunicações e a própria Fundação Portuguesa das Comunicações são proprietários
de um acervo museológico de décadas e, em alguns casos de séculos, testemunhos
do longo processo das comunicações e de uma parte da nossa identidade.
Este património, ciosamente guardado e
preservado pelos nossos antecessores e pelas gerações atuais, poderá estar em
risco devido às privatizações do setor das comunicações, acrescendo às
privatizações a possível deslocalização das sedes das empresas, algures para o
exterior - Xangai ou Pequim, Cidade do México, Rio de Janeiro ou São Paulo,
Nova Iorque, Paris ou Luanda...
Se este património com centenas de milhares de
peças fez parte do nosso desenvolvimento e da nossa ciência, pois que muitas
peças foram inventadas ou manufaturadas / fabricadas / editadas em Portugal e
são parte das nossas memórias; porque não nacionalizar este património, tal
como se fez com a arte (Museu Nacional de Arte Antiga, Museu Nacional de Arte
Contemporânea, Museu Nacional Machado de Castro, Museu Nacional Soares dos
Reis, Museu Nacional do Azulejo); com o traje (Museu Nacional do Traje); com o
teatro (Museu Nacional do Teatro); com a etnologia (Museu Nacional de
Etnologia); com a arqueologia (Museu Nacional de Arqueologia) e com os coches
(Museu Nacional dos Coches) - criando-se o Museu Nacional das Comunicações ou
uma versão ainda mais lata - um Museu Nacional das Comunicações,
Transportes e Descobertas! porque todos estes itens estão relacionados com as
comunicações e tecnologias afins.
O setor privado, detentor do património, poderá
alegar que continuará a apoiar e preservar os valores patrimoniais e
museológicos. Contudo, sabemos que a sua vocação está particularmente virada
para os negócios onde as estratégias assentam no lucro quanto mais imediato
melhor. Deste modo vemos como possíveis algumas formas deste património ser
poupado às instabilidades nos negócios, às diferentes sensibilidades na
conservação e divulgação. Importa que este valor histórico continue ao serviço
da ciência, ensino e lazer, de todas as pessoas que vivem em Portugal e espaço
lusófono ou dos que nos visitam em férias e trabalho.
A solução mais eficaz será o Estado negociar a
nacionalização do património com os proprietários - CTT, PT, ANACOM, FPC -
Fundação Portuguesa das Comunicações e outras entidades detentoras de acervos
relevantes e de interesse nacional. Outra via possível e intermédia permitiria
as entidades detentoras de patrimónios continuarem com a propriedade dos
mesmos, mas com garantias de que as peças classificadas não sairiam do país e
seriam bem preservadas e divulgadas.
Há outras soluções, aqui não abordadas, que
podem ser implementadas para minorar os riscos resultantes das privatizações e
entidades particulares que, ou não estão vocacionadas, ou não têm os meios
suficientes para proteger os valores de interesse nacional.
Esperando que, entre o período de estudo,
reflexão e decisão, não haja perdas de tempo nem a dispersão dos valores que
refletem um dos padrões de identidade que os nossos antepassados nos legaram
com muito esforço e carinho.
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