“Tlão … ressoam os bronzes da sé … tlão …
badaladas, lentas no respirar suspenso … tlão … arrastadas no nervoso dos
corações … tlão … seus semblantes rígidos, olhos vigilantes … tlão … cinco … as
mãos aferradas às coronhas das pistolas … tlão … seis … dos punhos de punhais,
dos cutelos … tlão … sete … ih! cum raio! … tlão … oito …
Ao soar da última
pancada, as sentinelas vêem chegar um fidalgo que se apeia de pomposo coche,
como a ter audiência com Sua Excelência o secretário de estado [Miguel de
Vasconcelos] …” (1).
(1)CAMPOS, Fernando – O Lago Azul.- Viseu:
Difel, S. A; Tipografia Guerra, 2007, 304 páginas.
Resumo crítico sobre esta Obra. O Autor Fernando
Campos tem uma interessante veia literária, também de historiador, cientista e
filósofo. Nesta obra– O Lago Azul, o
autor descreve interessantes páginas de História de Portugal, nomeadamente sobre
os descendentes de D. António Prior do Crato, proclamado Rei de Portugal após a
morte de D. Sebastião. Fernando Campos põe o
vento como narrador. O vento está em todo o lado, em toda parte. Nesta obra
o vento descreve e toma partido, por
vezes é maroto. Campos dá-nos a conhecer o destino do Prior. Põe em
destaque o ambiente entre católicos e protestantes; o nascimento da Holanda, as
paisagens suíças e o definhar de
Portugal quando integrado na monarquia dos Filipes.
Sinos de transmissão mensageira
Bens de importância primeira.
Comunicais atenção,
Dor, alegria aflição
Festa, folia, reunião.
Desde tempos
remotos se utilizaram os sinos. Regularmente ao alvorecer podia ouvir o toque
das almas. Ao meio-dia e cinco, o Ângelus. Os fiéis respondiam com uma Avé
Maria. Antes do cair da noite tocava a Trindades. Momentos para
oração e recolhimento. À tarde tocava para o terço ou missa; aos domingos e dias
santos tangiam sonoridades para as eucaristias. O último toque do dia fazia-se
com o cair da noite. Era o toque das almas ou toque das Avé Marias.
A estes toques de rotinas juntavam-se os toques horários.
Com a eletricidade,
o velho relógio de carretos é substituído. As horas passam a ecoar através de
altifalantes instalados na torre.
No dia de
Páscoa tocam os sinos pela tarde enquanto decorre a passagem do compasso e passa
a comitiva pelas casas transmitindo cumprimentos e Boa Nova: “Cristo
ressuscitou, aleluia, aleluia”.
Os sinos
anunciam cerimónias e avisos: batizados, casamentos, enterros. Os toques a rebate
acontecem em caso de fogos.
Distintos em
mais de uma dezena de casos, os toques têm o seu código próprio. As várias
sonoridades, ritmos e frequências determinam o tipo de informação. Podem tanger
sons tristes ou alegres, lentos, rápidos ou ultra rápidos, dobrados ou
singelos, fortes ou leves. Em caso de morte, permitem informar o tipo de
pessoa: adulta ou criança. Hoje em dia continuam alguns destes trechos sonoros.
Os sinos cumprem funções. De tão presentes e disponíveis, quase não damos pelo
seu valor.
Nas últimas
décadas os sinos perdem alguma importância, fruto de alterações na vida social
e tecnológica. Relógios de pulso e telemóveis, hábitos diversos, televisão,
informática e quebra de hábitos religiosos têm determinado alterações de rotinas
e emergências.
Em algumas
torres e casas de Sineiros decorrem exposições. Aqui, no Brasil e noutras
partes do globo.
Torre
e casa do Sineiro de Leiria. Imagem gentileza da CML
“As igrejas de São João del-Rei tem
(sic) um interessante e peculiar sistema de comunicação através dos sinos.
Sabe-se por exemplo, pelo repique, dobre ou toques onde será realizada a
solenidade; se haverá procissão; hora de missa, quem será o celebrante e muitas
outras informações. Nos dobres fúnebres fica-se sabendo se a pessoa falecida
era homem ou mulher e até mesmo qual será o horário do funeral […]” Cf. OLIVEIRA: 2007).
Devido a este património histórico,
cultural e turístico, alguns sinos e toques têm vindo a ser classificados como Património
Imaterial.
Imagem
da torre sineira da Beselga
É comum situar-se o início da
utilização dos sinos por volta do século VI, altura em que começam a ser construídas
igrejas nas povoações. O som era considerado a “Voz de Deus”. Afugentava
perigos, unia as pessoas, dava segurança.
Dizia uma figura típica da minha
Terra - o Alberto Pereira, mais conhecido por Alberto Francês.
“Não há sinos tão afinados como os da
Beselga. [nas Terras de Magriço e do Demo] Quando bem repenicados parece que
subimos ao céu”.
A este preceito escreve Miguel Torga
caracterizando diferentes modos de operar os sinos. Em Novos Contos da
Montanha (1966) diz este sóbrio Duriense:
“Os sinos tocavam festivamente, ia
por toda a aldeia um alvoroço de noivado […] pela coragem com que puxavam a
corda do badalo, pela maneira como repicavam ou dobravam, sabia-se a que terra
pertencia o cadáver que baixava à cova. Cada aldeia enterrava singularmente os
seus mortos. Os de Leirosa, bonacheirões, pacíficos, pobres, tocavam pouco,
devagar, sem vontade e sem brio. Mas já os de Fermentões, espadaúdos, carreiros
e jogadores de pau, homens de bigodaça […] davam sinais de outro modo, viril e
triunfalmente.” (TORGA, Ob. cit. 12ª Ed. 1952, p.
41; 65)
O sinos continuam a ser
imprescindíveis mas, ainda que pudessem ser dispensados, conviria preservá-los
como Bens culturais materiais e imateriais, instrumentos de comunicação e de
recurso quando outros sistemas possam eventualmente falhar.
Torres e sinos vêm sendo objeto de
salvaguarda e de aproveitamento para desdobramento de funções.
Imagem de torre sineira e de relógio
da Horta - Faial. À curiosidade desta peça de arte e funcional acresce o
facto de que é um dos poucos exemplares de torres sineiras independentes
da arquitetura das igrejas, tal como acontece em Leiria, Penedono ...
O presidente do Cabido da Sé chegou a
ouvir “modinhas populares” tocadas pelos sinos e, depois da implantação
da República, há informações de que foi pedido ao sineiro "para tocar
'A Portuguesa' e outras melodias republicanas" (“Os sinos de Leiria
têm histórias para contar; Sé de Leiria” in http://www.regiaodeleiria.pt/blog/2011/12/23/torre-da-se-os-sinos-de-leiria-tem-historias-para-contar-fotogaleria/; http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9_de_Leiria
)
Torres, sinos e toques, orientam,
informam, animam. Contribuem para a riqueza urbana, social e turística.
Que
a Páscoa continue em ressurreição, primavera, andorinhas, festas populares,
sardinhas, união.
Palavras-chave: comunicação, Páscoa, sinos, bens
culturais
Bibliografia / documentação:
-CAMPOS, Fernando – O Lago Azul.- Viseu:
Difel, S. A; Tipografia Guerra, 2007,
Fontes em linha, acedidas em 13.04.2017 e 21.04.2019:
-ANCIÃES, Alfredo Ramos – “038. Portugal é Memória é
Presente é Mar e é Futuro” - http://cumpriraterra.blogspot.pt/2015/03/38-torres-e-sinos-que-tanto-dais.html
-ANCIÃES,
Alfredo Ramos – “Os Sinos e a Páscoa” - https://cumpriraterra.blogspot.com/2017/04/038-os-sinos-e-pascoa-nas-terras-da.html
-CAVALCANTI, Maria Laura Viveiros de Castro;
FONSECA, Maria Cecília Londres – “Património Imaterial no Brasil” http://unesdoc.unesco.org/images/0018/001808/180884POR.pdf
-LEIRIA, Manuel; CLARO, Sérgio, et al. – “Os sinos
de Leiria têm histórias para contar” http://www.regiaodeleiria.pt/blog/2011/12/23/torre-da-se-os-sinos-de-leiria-tem-historias-para-contar-fotogaleria/
-OLIVEIRA, Silvana Toledo de “Turismo e património cultural
em São João DelRei/MG”.- http://www.eca.usp.br/turismocultural/silvana.pdf
-TORGA, Miguel – “Novos Contos da Montanha”.
Coimbra: 12ª ed. 1952. Disponível in https://cld.pt/dl/download/ba71439a-c0fb-496c-8c1c-15faff92d8ee/Miguel%20Torga%20-%20Novos%20contos%20da%20montanha.pdf?public=ba71439a-c0fb-496c-8c1c-15faff92d8ee
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