terça-feira, 12 de julho de 2016

07.TRANSMISSÕES TELEGRÁFICAS SUBMARINAS E A RELAÇÃO COM O DESPORTO CULTURA E RECREIO EM CARCAVELOS E HORTA-FAIAL


“O esforço é grande e o homem é pequeno [...]

A alma é divina e a obra é imperfeita [... ]

E ao imenso e possível oceano 

Ensinam estas quinas que  [... ]

O mar sem fim é português” (34)

(Pensamento F. Pessoa, cf. nota supra)


Os cabos telegráficos submarinos contribuiram para o desenvolvimento social, não só pela razão da troca de notícias e mensagens, mas pelo lado desportivo, cultural e recreativo que as equipas de técnicos cabotelegráficos proporcionaram em Carcavelos e na Horta-Faial. Ingleses, alemães, americanos, italianos, franceses e portugueses, entre outros, conviveram por via das Estações Cabotelegráficas.

Estação Cabotelegráfica de Carcavelos: Funcionou durante mais de 90 anos (1870-1960`s). Começou a sua atividade com o cabo Inglaterra (Porthurno onde também existe um dos raros museus telegráficos) - Portugal (Carcavelos) e daqui até Gibraltar (domínio inglês) com o propósito de se estender progressivamente ao Mediterrâneo, África e Oriente, destacando-se a Índia (Goa e Bombaim); passando por Cabo Verde, Guiné, São Tomé, Angola e Austrália.

No auge da Revolução Industrial e na época vitoriana, a Inglaterra tinha, sozinha, praticamente tanto poderio naval quanto o resto do mundo. Do ponto de vista das comunicações telegráficas também dominavam os britânicos. Foram, contudo, cedendo terreno aos americanos, alemães, portugueses, italianos e franceses. Numa altura em que não havia internets e a telefonia, por questões técnicas (35),  tinha dificuldades em atravessar os oceanos, as redes cabotelegráficas em código morse são privilegiadas e chegam a quase todo o mundo.

Em consequência, a comunidade britânica vem para a Quinta Nova de Santo António de Carcavelos passando, a partir daí, a ser conhecida por Quinta dos Ingleses. Nesta Quinta amarram cabos e instalam equipamentos de receção, transmissão e retransmissão.

A comunidade prima pelo nível técnico, cultural e desportivo, de modo que o nosso rei dom Carlos, “bom vivant” e ilustre, vem fazer desporto à Quinta dos Ingleses. Entre os desportos praticados e divulgados à sociedade portuguesa refere-se: O ténis, ciclismo, bridge, cricket e o “footeball”.

Em 1873/74 é a vez da Madeira se ligar ao continente europeu através de Carcavelos e passa a comunicar também com Cabo Verde e Atlântico Sul, incluindo o Brasil. A partir de 1893 entra em ação o importante ponto estratégico dos Açores, especialmente a Estação Cabotelegráfica Intermédia da Horta que proporciona a telegrafia elétrica morse entre a Europa e consequentemente a posterior ligação à América do Norte: Canso - Canadá e Manhattan Beach - Nova Iorque EUA.

Na Quinta dos Ingleses é criada uma escola para servir a comunidade britânica. Com a desativação da Estação de Carcavelos e dos obsoletos cabos telegráficos, preserva-se o edifício, onde continua a escola bilingue denominada St. Julian`s School e uma área livre adjacente (36).

Estação Cabotelegráfica da Horta:  Em cerca de 76 anos (1893-1969) de funcionamento, foram muitas as relações entre os recursos humanos situados nesta Ilha do Atlântico,  elevada a uma espécie de centro do mundo (37). O facto dos técnicos estarem longe das suas terras natais e permanecerem anos seguidos na Ilha, acaba por proporcionar um reforço de comunicação com a população local. Assiste-se na Horta e Ilha do Faial a relações de amizades, namoros e casamentos, aprendizagem de línguas, novas práticas desportivas e editoriais (38) por causa da Estação e junções telegráficas.

Na relação cultural “[…] os funcionários das companhias e as suas famílias faziam parte de um novo processo através do qual o mundo estava cada vez mais interligado […] O cosmopolitismo floresceu no Faial em espaços de convívio como o “Café Internacional, o Peter Café Sport, British Sports Club, o grupo alemão Deutscher Sportvereein Horta, o Comercial Sport Club, o Eastern Sport Club, o Western Union, instituições de imprensa local, como O Telégrafo, e espaços culturais e de socialização da Horta” (39).

A Europe & Azores Telegraph Company, Limited e a Eastern Telegraph Company (inglesas), a CCC - Commercial Cable Company, a WUTC- Wester Union Telegraph Company (americanas), e a DAT – Deutsh Atlantiche Telegraphen Gesellscaft (alemã),  são as principais operadoras da rede de cabos na Horta utilizando a Estação designada Trinity Housepor via das três principais nacionalidades ali instaladas. Os últimos serviços de telegrafia morse  por cabo são desativados em 1969, por causa da concorrência de novas tecnologias: cabos telefónicos com regeneradores de sinais, pelos quais pode transitar simultâneamente a nova telegrafia de tipo telex, alcançando grandes distâncias, entre continentes, e sem necessidade da Estação Intermédia na Horta.

Desse tempo ficaram marcas patrimoniais na Horta e memórias que o Museu local está a recuperar e divulgar, dignificando um período de boas relações internacionais, demonstrando que a convivência entre nações e a cidadania é possível e desejável.

Fontes para VIII - Transmissões Telegráficas Submarinas e a Relação com o Desporto Cultura e Recreio em Carcavelos e Horta-Faial:


-ANCIÃES, Alfredo Ramos

------------–Património museológico de telecomunicações: criação e gestão em contexto - Revista Códice, nº 5, Ano XI, II Série, 2008

-------------Telegrafia eléctrica - Revista Códice, nº 2, Ano VIII, II Série, 2005

-------------Cento e cinquenta anos da telegrafia eléctrica em Portugal – Dossier de Exposição, Fundação Portuguesa das Comunicações. Lisboa, 2005

-CARDOSO, Guilherme; MIRANDA, Jorge; TEIXEIRA, Carlos A. - Registo fotográfico de Carcavelos e alguns apontamentos histórico-administrativos. Cascais: Câmara Municipal de Cascais, 1988

-MUSEU da Horta; Associação dos Antigos Alunos do Liceu da Horta - O Porto da Horta na História do Atlântico: O Tempo dos Cabos Submarinos Ed. do A. Museu da Horta; Assoc. Antigos Alunos do Liceu da Horta. Impressão: Gráfica O Telégrafo. Criação Gráfica: JCS/Açores. Horta, 2011 ;


Em linha acedidas em 28.3.2015:

-COSTA, Ricardo Manuel – Breve Esboço sobre a História do Faial - http://www.inventario.iacultura.pt/faial/horta/historia.html, 2007

-LEONARDO, A.J.F.; MARTINS, D.R.; FIOLHAIS, C. A telegrafia eléctrica nas páginas de “O Instituto”, 2009. Disponível em https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/12323/1/A%20telegrafia.pdf, acedido em 7.4.2014
 -VARÃO, Isabel - Os Cabos Submarinos e a Expansão da Telegrafia Internacional no Século XIX - Códice. Revista da Fundação Portuguesa das Comunicações. Lisboa: FPC, 1998, p. 58-62

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