sábado, 12 de maio de 2018

TERRAS DE JAMOR: MODERNIDADE E TRADIÇÃO


 

Colectividade em Terras de Jamor

Bens Culturais e Naturais (vulgo Patrimónios) interpretados à luz da História. Cesário Verde morre prematuro, aos 31 anos. Segundo a média de esperança de vida, Cesário poderia ter vivido até aos alvores do modernismo. Não foi o caso. Porém, como em todos os estilos e movimentos, existem os chamados precursores. É neste movimento de para-modernismo que incluímos Cesário quando interpreta a mulher da cidade como um «[…] tipo feminino calculista, destrutivo e frívolo, associado com a aristocracia […]» (cf. Retrato equestre de Ana de Áustria", por Jean de Saint-Igny) in https://pt.wikipedia.org/wiki/Cesário_Verde )

Em contraste com a mulher do povo ou «[…] A vendedeira de "Num Bairro Moderno" (1877) […] desgraçada, trabalhadora e inocente. (cf. "Rapariga com cesto ao ombro", por Teresa de Saldanha in https://pt.wikipedia.org/wiki/Cesário_Verde). É de notar que se trata de um retrato da Ir. Teresa de Saldanha que estudámos acerca da visita ao convento dos Cardaes, filha de Isabel Maria de Sousa Botelho Mourão e Vasconcelos, Condessa de Rio Maior, duas referências de primeiro nível na assistência social a desvalidos e invisuais na segunda metade do século XIX)

 


Retrato de Fernando Pessoa por Almada Negreiros

Verificamos nestes quadros e no elogio de Pessoa a Cesário (considerando-o como mestre) um indicador de, como um território perto de Lisboa influencia a poesia, atrai moradores e visitantes, tais como: Garrett (o Homem das “Viagens na Minha Terra”  e a esta micro região das Terras de Jamor. Cesário, Hein Semke, Almada Negreiros, Abel Manta, Pessoa, Vieira da Silva e Árpád Szenes; autores estes relacionados com a natureza e o modernismo, frequentaram e/ou viveram em Linda-a-Pastora.

É de notar que os seus nomes figuram na toponímia local, revelando a homenagem das pessoas e dos poderes locais.

Após Garrett (Porto, 1788; +Lisboa, 1854) sucede-se uma época de romantismo e, a nível económico e político, o movimento de Regeneração do País. Cesário é, em parte, um reflexo da Regeneração. Há mudanças sociais: Nobreza, Burguesia e Povo vão partilhando influências. O Poeta vive entre Lisboa, no comércio de seu pai, e a Quinta de Linda-a-Pastora. É influenciado pelo cadinho social e económico e pela geografia.  

 O movimento de modernidade procura sensações no meio ambiente. Pessoa é um dos autores deste movimento. Alberto Caeiro, seu heterónimo é pastor. Nele destaca os valores das experiências concretas baseando-se na simplicidade e nas coisas reais, nas sensações e na linguagem comum, não rebuscada.

«[…] Pensar numa flor é vê-la e cheirá-la
E comer um fruto é saber-lhe o sentido.

Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de gozá-lo tanto,
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,
Sinto todo o meu corpo deitado na realidade […].

(Pessoa, Fernando - “O Guardador de Rebanhos”,  Poemas de Alberto Caeiro. Lisboa:  Athena, 1925)

 

Toponímia em Linda-a-Pastora

Negreiros, contemporâneo de Pessoa, frequenta as Terras do Jamor, onde também é evocado na toponímia e onde terá expresso as suas ideias de modernismo e futurismo. O movimento não surge ao acaso. É influenciado pelas ciências e técnicas contemporâneas. Os valores culturais do passado são relativizados, quando não excluídos. A mala-posta, os caminhos-de-ferro, a telegrafia e, sucessivamente: o caro eléctrico, a máquina fotográfica portátil, o futebol, o automobilismo e o ciclismo trazem a noção e sensação de que o progresso está na técnica, nas coisas materiais e novas. As rádios: particular, pública e portátil levam música, teatro e informação através do espaço etéreo; a telegrafia permite a comunicação escrita entre diversas localidades. O progresso com novos materiais como o aço para as construções e as matérias plásticas para fabrico de equipamentos: telefónicos, rádio, automóveis, dão a impressão de que o passado pode ser dispensado. 
Os loucos anos 20`, de entre guerras, dão uma ideia de que o Homem e a Vida são um binómio a exaltar nos casinos, na dança, nas viagens, nas relações conjugais e sexuais mais livres. Contudo, os finais dos anos trinta trazem dissabores com o confronto de ideologias. As liberdades e as artes começam a ser censuradas. Ao modernismo começa a suceder o historicismo, o destaque dos heróis e dos tempos de outrora. Os autores são vigiados. Hein Semk vive cerca de 20 anos em Linda-a-Pastora. Como os tempos mudam, opta por estar mais próximo dos acontecimentos na capital, para onde vem morar e trabalhar.

Representação do pastor em Queijas

O mundo idílico baseado na Natureza das Terras do Jamor já não é o mesmo, a realidade mostra-se cada vez mais exigente e diversa. A arte já não é só criatividade, beleza e modernidade, é também funcionalista num mundo em crescente movimento de transformação, litorização e antagonismos ideológicos.

Estando mais próximos do poder e do mundo urbano é, também, uma forma de estar mais em sociedade, acompanhar os movimentos, a imprensa e a informação. No mundo rural, onde as vias de comunicações e as deslocações ainda são difíceis, deixam de interessar aos modernistas. Preferem a cidade, onde se realizam aterros, projectos ditos higienistas, como o entubamento da Ribeira de Alcântara e a construção de bairros para a classe média e média-alta.

 

O Anjo protector

As Terras do Jamor vão sendo abandonadas pelos poetas e artistas. Não obstante, permanecem até meados do século XX, explorações agrícolas e um certo mundo saloio com pastores, lavadeiras e vendedores de produtos rurais.
Nossa Senhora da Rocha e o jardim envolvente vão perdendo para para um mundo mais laico, de desportos, atracões pelos grandes clubes, Feira Popular e Televisões que vão contribuindo para a diversificação dos tempos de lazer. Contudo, as Terras de Jamor merecem ser fruídas e restauradas, respeitando os Bens Culturais e Naturais.
A partir do próximo dia 18 de Maio e até quase finais do mês vão realizar-se as festas de Nossa Senhora da Rocha. É mais um motivo para vir visitar as Terras de Jamor. Reflectir no quanto elas foram importantes e pensar no modo como poderão voltar a ser úteis para o Homem da actualidade.   

Tags: Carnaxide, Linda-a-Pastora, modernismo, mundo rural, nova museologia, Oeiras, Queijas, Terras de Jamor

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Outras fontes, acedidas em 13.05.2018:

-Anciães, Alfredo – “Da lenda ao conto e à estória com lindas pastoras” http://cumpriraterra.blogspot.pt/2018/04/para-uma-reinterpretacao-do-territorio.html

-Anciães, Alfredo – “Dona Libânia – linda pastora” http://cumpriraterra.blogspot.pt/2018/03/blog-post_24.html

-Anciães, Alfredo – “Entre lindas pastoras fratrimonializar” http://cumpriraterra.blogspot.pt/2018/04/entre-lindas-pastoras-fratrimonializar.html

-Anciães, Alfredo – “Linda-a-Pastora: Adaptação de uma variante da lenda” http://cumpriraterra.blogspot.pt/2018/04/linda-pastora-adaptacao-de-uma-variante.html

-Anciães, Alfredo – “Linda-a-Pastora Terras de Jamor”


-Anciães, Alfredo – “Visita com degustação de miminhos” http://cumpriraterra.blogspot.pt/2018/04/visita-com-degustacao-de-miminhos.html

-Hein Semk em Linda a Pastora in https://www.flickr.com/photos/biblarte/34328497923

-Modernismo: relação com Fernando Pessoa e o mestre dos heterónimos Alberto Caeiro in https://www.youtube.com/watch?v=9iIf1oPwwpE

1 comentário:

  1. A partir do próximo dia 18 de Maio e até quase finais do mês vão realizar-se as festas de Nossa Senhora da Rocha. É mais um motivo para vir visitar as Terras de Jamor. Reflectir no quanto elas foram importantes e pensar no modo como poderão voltar a ser úteis para o Homem da actualidade.

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