terça-feira, 12 de março de 2019

BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL (BNP) (II)

BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL (BNP)
EX REAL BIBLIOTECA PÚBLICA
 
 Donzela junto à portaria do grande auditório. Destaca-se o ideal de novo, tal como pretensamente “novo” era o Estado da altura. É a juventude promissora de vida, ao serviço da Nação. António Duarte traça com virtude a nudez elegante e natural. Estética modernista, da segunda geração de autores, exposta no espaço público. É uma arte ao Serviço, através da imagem que mostra os seus dotes mas com uma expressão de quem tem noção da missão. O olhar um nada cabisbaixo transmite essa responsabilidade, um certo contraste, entre um corpo altivo e bem exibido.
Palavras-chave: arquivologia, Biblioteca Nacional de Portugal, biblioteconomia, História, arte nova, Estado Novo
       Em 1796 é criada a Real Biblioteca Pública. Faz presentemente 223 anos de existência. Tal como o nome indica, a biblioteca instalada no Terreiro do Paço permitia o acesso ao público. Presume-se que a todo o público interessado. Note-se que era caso raro, a nível mundial, as bibliotecas disponíveis para todo o público interessado. Exceção feita às Bibliotecas: Mazarino, em França; Trinity College, em Dublin / Irlanda e poucos mais casos haverá.
       Com a Reforma protestante e a contra Reforma católica, seguidas pelas Revoluções liberais, as escolas e a cultura começam a estar disponíveis aos interessados. Releve-se que esse embrião de cultura também havia sido tomado pelas escolas jesuíticas.
«Os padres jesuítas tinham sólida formação cultural e estavam dispostos a todo e qualquer sacrifício para defender os princípios cristãos […]».
Note-se que esse impulso resultara da resposta católica às reformas protestantes e não são alheias as «orientações filosóficas das teorias de Aristóteles e São Tomás de Aquino, principalmente no que se refere à ideia de universalização do ensino […].
Contudo, “[…] a educação jesuítica não satisfazia o Marquês de Pombal, primeiro-ministro de Portugal de 1750 a 1777, porque as escolas da Companhia de Jesus atendiam aos interesses da fé, enquanto Pombal se preocupava em atender os interesses do Estado […]. Dessa forma, retirou a Igreja Católica do domínio da educação em Portugal e mandou fechar todas as escolas que estavam sob domínio dos padres jesuítas, e as bibliotecas dos conventos foram abandonadas ou destruídas. […]. A educação passou a ser administrada pelo Estado […]. (Cf BERNARDES, Luana, ob. cit.)
Para colmatar a perda do ensino jesuítico, Pombal faz a sua própria reforma do ensino, sobretudo em Coimbra e cria, em Lisboa, o Colégio dos Nobres. Diga-se, aliás, com escassos resultados práticos, até que as instalações na Cotovia, (atual Rua da Escola Politécnica), acabam por transformar-se em ensino para a ciência; primeiro como Escola Politécnica virada para a sociedade burguesa e depois como Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Com o tempo e o evoluir da República, a Escola vai-se democratizando. 
«Os Colégios de Jesuítas no mundo […] a decisão de alargar o ensino aos estudantes não religiosos contribuiu de maneira decisiva para o crescimento extraordinário dos Colégios da Companhia de Jesus pela Europa fora […] mas nenhum lugar é tão receptivo como Portugal […]. O antigo mosteiro de Santo Antão, na Mouraria, é a primeira Casa que os Jesuítas possuem no mundo inteiro (em Janeiro de 1542); em Coimbra, fundam um Colégio junto da universidade […]. No princípio os estudantes recorrem à Universidade de Coimbra para obter o diploma, mas a pouco e pouco, passa o próprio Colégio a conceder os graus universitários e a criar as suas próprias escolas públicas […].
Em 1551, Inácio de Loyola escreve a Simão Rodrigues pedindo-lhe para criar o ensino público em varias cidades de Portugal […] A primeira escola pública dos Jesuítas é aberta na já citada Casa de Santo Antão, em 1553, com grande sucesso. É a primeira vez que se propõe ensinar a título gratuito; por outro lado, a pedagogia utilizada é considerada inovadora para a época». (cf. SOUSA, Jesus Maria, Ob. cit.).
Remarque-se que este ensino assenta, grosso modo, em memórias documentais e bibliotecas. Muito deste acervo encontra-se ainda na BNP.  
No “reinado” do Marquês de Pombal (1750 – 1777) é desmembrado este impressionante contributo cultural. É certo que o próprio Marquês está ligado à sua própria reforma do ensino, após a queda da instrução jesuítica. Porém, a experiência mostra que a cultura escolar e pedagógica é algo de estrutural; está sujeita a retrocessos e os novos paradigmas demoram a ser implementados.
D. Maria I funda a Real Biblioteca Pública, em 1796. A rainha vinha denotando uma preocupação com a cultura. Em 1779 patrocinara a Academia Real das Ciências. Nela são investidos o Duque de Lafões (presidente) e o Abade Correia da Serra (secretário). D. Maria I e D. Pedro III fazem questão em se declarar «protetores» da Real Academia. Em seu torno são criadas classes de «Ciências e de Belas Letras». Mas a Academia não se limita ao espaço fundacional de Lisboa. Apoia a «plantação de oliveiras por todo o país e a criação de uma aula de Zoologia, orientada pelo Padre Joseph Mayne». (Cf. Academia das Ciências de Lisboa, et al. Ob. cit.).
O padre José Mayne e as suas “aulas maynenses” vão dar origem a um importante museu, hoje ainda existente na Academia de Ciências. Foi considerado, em tempos, como de interesse nacional. Ainda na Academia é instalada uma outra biblioteca, para lá da Real Biblioteca Pública. Esta biblioteca da Academia ainda revela imponência e beleza nos nossos dias.
       Entretanto as condições da Real Biblioteca na Praça do Comércio tornam-se pouco adequadas. A zona do Chiado, ao mesmo tempo: popular, burguesa e aristocrática, é preferida para instalação da Biblioteca. Aproveita-se o legado do ex Convento de São Francisco, vago aquando da extinção das Ordens religiosas. É aqui reinstalada e reanimada a Real Biblioteca Pública. Com o esmorecer do primeiro liberalismo, as crises de finais de regime monárquico e da I República, a biblioteca vai-se degradando, precisando urgentemente de obras e novos espaços. As carências e os graves problemas de conservação acabam por cair sobre o Estado Novo que manda estudar a viabilidade da reorganização e reinstalação. Os estudos técnicos mais credíveis apontam para uma obra de raiz, em vez das onerárias obras que seriam necessárias no Chiado. Opta-se por uma solução totalmente nova.
Ganha o projeto de Entre Campos/Campo Grande associado ao Campus da Universidade Clássica. Decisão tomada e projeto realizado entre 1950 e 1955. O Arquiteto Porfírio Pardal Monteiro é o escolhido. Desloca-se a alguns países da Europa, a fim de optar por uma boa construção e solução biblioteconómica eficiente. O seu sobrinho António Pardal Monteiro acaba por lhe suceder, quando Porfírio falece. As obras estão praticamente finalizadas em 1968 e em 1969 a nova biblioteca é reinstalada e posta em funcionamento. O projeto resulta arrojado para a época.  
Secção de baixo-relevo do pórtico principal, onde é possível observar figuras destacadas da História de Portugal. A autoria é do escultor Leopoldo de Almeida.
O depósito central tem 13 pisos e é algo inovador na arquitetura Lisboeta do tempo, sobretudo a nível de edifícios públicos. Somente o edifício do atual Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (ex Palácio das Corporações na Praça de Londres) se apresentava com mais altura do que a torre adjacente da Biblioteca Nacional.
A BNP incorpora obras da Real Mesa Censória e diversos conventos extintos em 1834. Cito aqui, em especial, um dos maiores bibliófilos de sempre e a nível mundial - frei Manuel do Cenáculo que está na origem da prospeção interna e internacional de tudo o que era editado e na aquisição de variadíssimas obras do seu tempo. A BNP ainda preserva cerca de 1600 títulos anteriores ao ano de 1500, sendo estes designados com o nome de incunábulos, isto é, algumas edições são anteriores e outras, imediatamente, posteriores à revolução da imprensa de Gutenberg.
Mais de 15.000 códices (manuscritos em pergaminho ou madeira) compõem as edições raras, preservadas na BNP. 
 
Em termos de supra coleções ou fundos documentais definimos cinco:
       1-Bens culturais organizados em fundos e coleções de “documentos dos séculos XI a XX”. Arquivos da administração central e local, judiciais, notariais, de família e eclesiásticos, sobretudo das Ordens Religiosas.
2-“Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea (ACPC)”. São cerca de 200 espólios de escritores e outras personalidades, dos séculos XIX XX.
3-“Cartografia e Iconografia”: Cerca de 124.000 títulos.
4-“Música”: Coleção com mais de 50.000 peças dos “séculos XII a XX”, entre partituras, impressas ou manuscritas, libretos, programas e cartazes.
5-“Leitura para Deficientes Visuais”: O serviço de Leitura para Deficientes Visuais possui e produz, desde 1969, obras em Braille e livros sonoros. Cerca de 13.000 peças são destinadas ao serviço público para Deficientes Visuais.  
 
O projeto do Museu do Livro foi transformado em espaços temáticos de exposições temporárias. 
A descrição e a gestão documental assenta na base de dados informatizados - PORBASE, versão 5. Outrora uma plataforma difícil de operar, mesmo para os técnicos. Atualmente, a versão 5 em ambiente Windows é uma plataforma de dados “amigável” que contém o catálogo em linha e muito mais. A BNP Colabora e coopera com as Bibliotecas Nacionais das antigas províncias ultramarinas.

Quanto a autores ligados à construção e decoração da BNP referimos onze nomes, entre outros:

1- Porfírio Pardal Monteiro – realiza o projeto de arquitetura.
2- António Pardal Monteiro – substitui o seu tio, por morte, na condução dos trabalhos.
3- Leopoldo de Almeida – escultor dos baixos-relevos da fachada principal.
4- Lino António – executa os frescos do átrio principal.
5- Guilherme Camarinha – é o responsável pela tapeçaria da sala de leitura geral, em colaboração com a Manufactura de Tapeçarias de Portalegre.
6- Raúl Lino – na supervisão das obras de arte. 
 
Das seguintes obras, todas ao ar livre, no recinto fronteiro da BNP
7- Álvaro de Brée – escultor português, especialmente ligado a Barcarena / Oeiras e Lisboa, executa a figura de Eça de Queirós.
8- Joaquim Martins Correia – executa a escultura de Fernão Lopes. (Não confundir este escultor com o professor escultor Joaquim Emídio de Oliveira Correia, mais conhecido por Joaquim Correia).
    Idem – escultura de Gil Vicente.
9- Euclides Vaz – escultura de Luís Vaz de Camões.
10-António Duarte – esculturas exteriores em bronze (donzela e rapaz), uma das quais aqui se reproduz no início deste artigo.
 
11-Raúl Lino – na supervisão das obras de arte. 

Referências acedidas em 11.03.2019:
--ACADEMIA das Ciências de Lisboa, et al. – “Academia das Ciências de Lisboa https://pt.wikipedia.org/wiki/Academia_das_Ciências_de_Lisboa )
--ANCIÃES, Alfredo Ramos – “Em visita de estudo à Biblioteca Nacional de Portugal (BNP)
--BERNARDES, Luana “Escolas Jesuítas”  https://www.todoestudo.com.br/historia/escolas-jesuitas
--FRANÇA, José Augusto, et al. – “A arte em Portugal no século XX” ; “António Duarte” https://pt.wikipedia.org/wiki/António_Duarte
--MANUFACTURA de Tapeçarias de Portalegre, et al. – [Guilherme Camarinha desenha e coordena a tapeçaria da sala de leitura geral] http://www.mtportalegre.pt/pt/artists/view/10/2  
--PASCOAL, Ana Mehnert et al.  Baixo-relevo de Álvaro de Brée ‘Três Musas’-  http://memoria.ul.pt/index.php/Baixo-relevo_de_%C3%81lvaro_de_Br%C3%A9e_%E2%80%98Tr%C3%AAs_Musas%E2%80%99 
--SOUSA, Jesus Maria – “Os Jesuítas e a RATIO STUDIORUM.- Funchal: Universidade da Madeira”, 2003. Também disponível em http://www3.uma.pt/jesussousa/Publicacoes/31OsJesuitaseaRatioStudiorum.PDF 
--WIKIMEDIA et al. – “Lino António” https://pt.wikipedia.org/wiki/Lino_António

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