segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

58. DA LUZ E DA RÁDIO: CISTER ALCOBAÇA PORTU|G(RA)AL

       Entre 2015 e 2016 comemoram-se 80 anos de radiodifusão pública em Portugal. O evento de oito décadas da Rádio e de 9 séculos da Ordem de Cister não podia passar ao de leve , como acontecimentos banais.

       O destino, a sorte, ou o acaso, fizeram com que fosse convidado a participar na avaliação (peça a peça) da coleção de radiodifusão que, em boa hora, José Madeira Neves recolheu e cuidou; a Câmara Municipal de Alcobaça adquiriu e preservou. 

 
Imagens 1 e 2. Recorte do cartão/gentileza do Sr. José Madeira Neves; Dir. Museu das Comunicações - Cristina Weber e Câmara Municipal de Alcobaça

       Em 1098 nasce em Cister, Dijon – França uma nova comunidade religiosa (1). Após cerca de dezassete anos, Bernardo instala-se num outro sítio, ermo de gente, e que viria a ser conhecido por Claraval. Tudo indicando que este nome vem de “Clara Vallis”, vale claro ou vale da luz, conotado com um significado bíblico e/ou religioso, à semelhança do que viria mais tarde a acontecer com a Luz de Benfica / Carnide, em Portugal. (2).

       É no “vale claro” ou vale da luz, próximo de Cister, que a comunidade se desenvolve, pese embora a intenção inicial de São Bernardo ser apenas a de se retirar para meditar, orar, levar uma vida simples e frugal que a anterior Ordem de Cluny já não estaria nas melhores condições de proporcionar.  

 

Imagem 3. Convento de Alcobaça

      Contextualização histórica:
      A nova Ordem de Cister atraiu, desde o início, grande adesão de membros e visibilidade. Fruto das condições da época é solicitada para povoar, defender, desenvolver e até conquistar ou reconquistar (3). Hoje em dia há várias terras que adotam a designação Terras de Cister com base no património edificado e cultural; também com base nos arroteamentos, secagem de pântanos, obras de hidráulica, metalurgia e mineração, entre outras obras realizadas e/ou geridas pelas comunidades cistercienses. 

 

Imagem 4. Rio Alcôa que poderá estar na origem do nome Alcobaça

       A Ordem de Cister desenvolveu os correios para intercâmbio entre os vários locais de implantação. Caminhos e pontes foram melhorados, nomeadamente para as visitas: regulares e pontuais das redes de conventos no âmbito nacional, peninsular e europeu.

       Alcobaça pertencia à Casa-Mãe de Cister (França) e tornou-se, ela própria no século XVI, como Casa-Mãe da mesma Ordem em Portugal. Há quem diga que nada acontece por acaso e, neste aparte, é oportuno trazer o caso da concretização, a breve trecho, da abertura dum espaço museológico de rádio e comunicações nas Terras de Cister de Alcobaça.

       Em meu entender o novo museu da rádio em Alcobaça deverá alargar a exposição a outros patrimónios de comunicações, que não só da rádio. Para lá dos equipamentos radioelétricos e musicais, poderá expor e divulgar a toponímia ligada às comunicações; o percurso dos correios monacais, as cartas e os textos, as tecnologias da escrita, o telégrafo, a telefonia, até às estações de rádio e imprensa da região.

Imagem 5. Antiga Casa Vazão, onde será instalado o novo Museu de Alcobaça


       Como nasceu o projeto do museu da rádio em Alcobaça?

       Resultou, em primeira instância, do labor de um colecionista e técnico, o Sr. José Madeira Neves que recolheu, colecionou e preservou durante anos um acervo que denominou “Espólio Colecção Madeira Neves – Casa das Máquinas Falantes”. A Autarquia foi sensível ao trabalho meticuloso do munícipe, adquiriu o acervo, fez uma pré-avaliação, peça a peça, e registou a informação em base de dados, dando-lhe uma mais-valia.

       Um Museu da Rádio, Pessoas e Comunicações (4) pode plasmar estas valências. A coleção tem, desde já, um espólio que inclui peças de música, telefonia, telégrafo, fonógrafos, rolos de cera, altifalantes, amplificadores, recetores, incluindo do tipo militar, televisões, gravadores e leitores de bobinas de fita, cabina/locutório, máquinas fotográficas clássicas, leitores óticos, entre outros espécimes.

       Este acervo terá nascido com uma primeira ideia de coleção de recetores de radiodifusão, evoluindo para o conceito de “máquinas falantes”. Em 2016 poderá ver a luz do dia já com um conceito mais abrangente na ótica das tecnologias e da cultura musical, comunicações e entretenimento. Terá um olhar especial para os patrimónios do universo cisterciense, mormente das trinca e cinco casas da Ordem que contámos no espaço nacional (5). Demonstrará que o desenvolvimento dos correios e as comunicações terrestres, muito ficou a dever aos monges cistercienses porque os mosteiros mantinham comunicações entre si, especialmente entre a Casa-Mãe e as associadas (6).

       A exposição será instalada na Rua Araújo Guimarães, envolvência do Jardim do Amor, do Arco de Cister e do Mosteiro. Há que dar vida a estes acervos, envolvendo o tecido humano e cultural, nomeadamente: associações musicais, etnográficas, comerciais, entre outras, porque todas usam e são produtoras de património e comunicações.

       Não basta ter um sonho, é preciso trabalhar em cima dele para que o sucesso seja uma realidade.
       Espera-se que, enfim, em 2017 este acervo possa ser apreciado em condições de leitura e interpretação.

       Sucessos mil ao novo museu da rádio, pessoas e comunicações.

Um Bom Natal

De Belém a Éfeso, Meca, Oriente, Europa, Cister, Claraval, África, Ásia, Austrália, Américas, Alcobaça ... Portugal.

       
Tags: Alcobaça, Comunicações, História local, Museologia Social, Museu da Rádio, Terras de Cister

  Notas:

       (1) Ordens religiosas são comunidades que podem ser de leigos ou clérigos, contudo, consagrados. Usam vestes características. Nos seus hábitos diários entram rotinas: levantar, orar, trabalhar/cuidar, retiro/reflexão/reclusão, recreio/comunicação, deitar. Existem quatro tipos de ordens religiosas: a) Monásticas: com homens ou mulheres, vivendo na comunidade dos mosteiros. Os Cistercienses, entre vários outros, estão inseridos nesta classificação; b)Mendicantes: com homens ou mulheres que vivem agrupados em comunidades de conventos, contudo têm uma vida menos isolada do que outros monges. Atuam ativamente no mundo secular, em obras com os pobres necessitados, serviço religioso de missas, procissões evangelização, etc. Os Franciscanos e Dominicanos, entre outros, pertencem a esta classificação; (c) Regrantes: são ordens de cónegos. Ex. de Santo Agostinho; d) Regulares: são os clérigos consagrados, vivendo em comunidade. Ajudam o clero secular nas paróquias, nas atividades da liturgia (missas), nos vários sacramentos e exercem a evangelização. Exemplo, os Jesuítas e os frades crúzios.

        (2) Repare-se que também o Mosteiro de Nossa Senhora da Luz de Carnide – Lisboa esteve na alçada dos monges cistercienses (no caso, de Seiça, concelho da Figueira da Foz), só em fase posterior passou para a órbita da Ordem de Cristo de Tomar.

        (3) São Bernardo, cognominado de Claraval, esteve pontualmente envolvido na ideologia das cruzadas. Quando analisadas de modo descontextualizado, as cruzadas parecem ter sido um erro histórico. No entanto devemos olhar para as raízes e o desenvolvimento do processo da Reconquista que teve como resultado o desabrochar de Portugal e o desenvolvimento do comércio entre o Ocidente e o Oriente. As cruzadas foram uma reação ao processo de expulsão e acantonamento forçado a que estiveram sujeitas as populações refugiadas nas regiões montanhosas, sobretudo das Astúrias. Hoje em dia, ambas as civilizações: de raiz islâmica e cristã deviam pedir mutuamente perdão porque ambas prevaricaram em invasões e barbarismos. É preciso um reinício de nova Era, de mútua aceitação, paz e prosperidade.

      (4) Esta é uma das designações possíveis que aqui incluo - Museu da Rádio Pessoas e Comunicações das Terras de Cister. Será mais abrangente do que apenas um museu baseado na simples referência técnica dos aparelhos de rádio. Cabe, porém, aos responsáveis uma designação que seja o mais consensual possível entre os autarcas e as populações.

       (5) Datas aproximadas do início do funcionamento destas comunidades religiosas cistercienses(a) nos seguintes locais.

- Lafões (H) 1138

- Tarouca (H) 1143

- Sever (H) 1144

- Alcobaça (H) 1153

- Salzedas (H) 1156

- São Pedro das Águias (H) 1170

- Santa Maria de Aguiar (H) 1174

- Tomarães (H) 1172

- Fiães (H)1175

- Stª Maria de Bouro (H) 1174

- Maceira Dão (H) 1188

- Seiça (H) 1195;

- Stª Maria da Júnias (H) 1209;

- Stª Maria de Ermelo (H) 1250;

- Stª Maria da Estrela (H) 1220;

- S. Paulo de Frades ou de Almaziva (H) 1221;

- Colégio do Espírito Santo ou de S. Bernardo (H) 1550;

- Nª Srª do Desterro (M) 1590

- Colégio de Nª Srª da Conceição de Alcobaça (H) 1648

- Lorvão (H) 1206

- Stª Maria de Celas (M) 1214

- Arouca (M) 1223

- Stª Maria de Cós (M) 1249

- S. Salvador de Bouças (M)

- S. Bento de Cástris, Évora (M) 1275

- Stª Maria de Almoster (M) 1278

- S. Dinis, Odivelas (M) 1295

- S. Bento de Xabregas (H) 1492)

- S. João de Vale Madeiro (M) 1530

- S. Bernardo ou Nª Srª da Conceição de Portalegre (M) 1530

- S. Bernardo de Tavira ou Nª Srª da Piedade de Tavira (M) 1530

- Nª Srª da Nazaré do Mocambo (M) 1653

- Tabosa de Sernancelhe (M) 1692

- Nª Srª do Desterro (H) 1763 (reconstrução)

- Real Misericórdia de Nª Srª da Nazaré, Setúbal (M) 1771

(cf.  Mapa e lista de Mosteiros Cistercienses em Portugal “Ordem de Cister. Herança cultural em Portugal e na Europa” - http://www.snpcultura.org/ordem_cister_heranca_cultural_portugal_europa.html, aced. 7.12.2015)

      (6)Após o encerramento forçado, por altura do Regime Liberal, tudo parece indicar que há vontades e condições para algumas destas comunidades cistercienses se voltarem a instalar em Portugal. 

       (a) o “H” significa Homens e o “M” Mulheres:

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Fontes:

-Anciães, Alfredo Ramos; Câmara Municipal de Alcobaça  -  "Avaliação da coleção de recetores de rádio, telégrafos, amplificadores, altifalantes, telefones, microfones e televisão". Sintra / Alcobaça, 2007

-Franco, José Eduardo – O Esplendor da Austeridade. Lisboa: INCM – Imprensa Nacional Casa da Moeda, 2011. “Tema: História, Antropologia, Sociologia, Economia e Política”, Portugal; Terras de Cister.

 Documentos em linha, acedidos em 06.12.2015 -

-900 anos S. Bernardo de Claraval - http://www.arautos.org/especial/28855/sao-bernardo-de-claraval.html ; http://www.arautos.org/noticias/67679/2015--Abadia-de-Claraval-festeja-900-anos.html



-Câmara de Alcobaça adquire lojas armazéns Vazão para instalar o futuro museu da rádio - http://www.pportodosmuseus.pt/2015/10/06/camara-de-alcobaca-adquire-lojas-armazens-vazao-para-instalar-o-futuro-museu-da-radio/






-Museu da rádio será instalado nos antigos armazéns Vazão - http://www.oalcoa.com/museu-da-radio-sera-instalado-nos-antigos-armazens-vazao/

- Museu das Rádio em Alcobaça - http://www.regiaodeleir


-Ordem de Cister. Herança cultural em Portugal e na Europa - http://www.snpcultura.org/ordem_cister_heranca_cultural_portugal_europa.html

Imagens: -

       1 a 2. José Madeira Neves; Dir. Museu das Comunicações - Cristina Weber; Câmara Municipal de Alcobaça;

       3 a 5. Arq. pessoal AA

1 comentário:

  1. A TODOS OS AMIGOS DESTA PLATAFORMA BLOGSPOT E EM GERAL UM NATAL COM FELICIDADES MIL.

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