quarta-feira, 1 de julho de 2015

47. MEIOS E TECNOLOGIAS DE COMUNICAÇÃO NO FILME - “O PÁTIO DAS CANTIGAS”

       O Pátio das Cantigas é um filme clássico português, realizado em 1942. As festas populares de junho, prosseguidas pelas estivais dão-lhe o mote. Neste filme entra uma trilogia de célebres atores: Vasco Santana (Narciso), António Silva (Evaristo) e Ribeirinho (Rufino), entre outros. O género é de comédia. O valor histórico tem determinado a sua reposição, inclusivamente a sua reedição que terá a estreia, com atores atuais, em finais de julho do corrente ano de 2015.

Vamos ver como vai ser aceite pelo público, sendo que o título e a imagem original lhe dão projeção. Por outro lado, é uma imensa responsabilidade trabalhar sobre uma marca e atributo que tem sido de grande aceitação.

Imagem de contexto em 1942
      Sob o ponto de vista das tecnologias de animação e comunicação começamos por Carlos Alves (Sr. Engenhocas) que vivia num prédio do Pátio das Cantigas e lidava com vários equipamentos, entre eles: uma grafonola e altifalante de sacada. Punha toda a gente alegre e a dançar. A casa do Sr. Engenhocas era ainda equipada com um aparelho de rádio que o próprio Engenhocas diz ter inventado; um telefone automático de mesa modelo de coluna e um telefone de parede, modelo Herrmann/português com adaptação de bateria local e chamada por magneto (manivela).

A Srª Rosa (Maria das Neves) é avisada de que chegou a sua filha do Brasil.

Do Pátio das Cantigas, presumidamente na Ajuda, à Praça da Figueira são utilizados cinco meios de transmissão da comunicação:

Primeiro admirador e primeiro meio de comunicação: O Evaristo tenta o contacto com a Srª Rosa por telefone. Concretamente trata-se de um telefone automático modelo de coluna, com marcador de disco rotativo. Os primeiros telefones automáticos haviam sido inaugurados em 1930, em Lisboa. Porém, em 1942 (data do filme O Pátio das Cantigas) a telefonia automática, sem necessidade de Telefonista, ainda se limitava a Lisboa e circunvizinhança. Também no Porto, havia uma zona da cidade e envolvimento, então explorada pela APT – The Anglo-Portuguese Telephone Company, Limited que precedeu os TLP – Telefones de Lisboa e Porto. Fora destas zonas, quase todo o território nacional, explorado pelos CTT, utilizava ainda os telefones manuais de bateria local, isto é com grossas pilhas e manivela para chamada da Telefonista que, por sua vez, comutava a ligação entre os utilizadores: chamadores e chamados.
Imagem publicidade “cartaz publicitário de Cunha Barros/APT” in Arq. da Fundação Portuguesa das Comunicações. Dois telefones deste tipo foram utilizados nas gravações d` O Pátio das Cantigas

Acontece que a prática em utilizar os telefones automáticos era escassa e a tecnologia também não seria muito eficaz. O Evaristo, antes de conseguir ligação com a Srª Rosa, engana-se quatro vezes a marcar o número ou foi afetado pelo cruzamento involuntário de linhas. Na primeira vez a comunicação vai parar à Maternidade Alfredo da Costa; noutra tentativa vai parar à Escola Agrícola da Paiã (Pontinha-Odivelas); nova tentativa vai para o Jardim Zoológico; outra tentativa ainda, vai parar à Praça de Touros do Campo Pequeno. Só à quinta vez, o Evaristo liga ao calha tentando números, mesmo sem olhar para o disco. E não é que, desta vez, acerta a ligação!

A Srª Rosa atende o telefone na Praça da Figueira. Para agradarem à Florista, os outros admiradores, também tentam as suas sortes com meios de transmissão diferentes. E tudo se baralha!

Segundo admirador e segundo meio: O Evaristo envia um pombo-correio com uma mensagem que chega ao mesmo tempo da chamada telefónica. A Srª Rosa fica tão emocionada ao ver o seu pombinho “fofinho [que lhe] traz um recado”. E deixa o aparelho telefónico a falar sozinho, não conseguindo atender o admirador com a nova da chegada da filha, do Brasil.
Por sua vez, Narciso diz para o pombo-correio “Vai depressa para mostrar que o melhor telégrafo ainda é o pombalino” (de pombo-correio).


Pombo-correio
     Terceiro admirador e terceiro meio: Tudo numa questão de segundos ou micro segundos, chega a informação via radiodifusão através dum aparelho que o Radioamador - Sr. Engenhocas emprestara à Srª Rosa. A mensagem da rádio era muito simples: “Srª Rosa chegou a sua filha”.

Desfile etnográfico de Radioamadores na Horta – Faial em 2014 (1).

Quarto admirador e quarto meio: Entretanto chega um Boletineiro (2) com a mensagem que havia sido emitido nos Correios, hipoteticamente da freguesia da Ajuda ou de Belém; vizinhas do Pátio das Cantigas, onde o expedidor dera a indicação de que fosse transmitido depressa (3).


Ciclista Boletineiro no Terreiro do Paço
      Quinto admirador e quinto meio: Uma mensagem verbal chega através dum miúdo a pé. Quando a criança aborda a Srª Rosa, o Mensageiro não consegue falar de tanta emoção e/ou cansaço e é a própria D. Rosa que se antecipa à voz do menino dizendo:

- Já sei, chegou a minha filha!

No final comparecem todos os admiradores a reivindicar, cada um, a primícia da chegada da mensagem com intenção de ficarem bem vistos.

- Não é verdade que quem lhe deu primeiro a notícia foi o meu pombo, que por acaso é seu?! - pergunta o Narciso.

Porém, a mui pretendida dama atalha dizendo para os pretendentes:

-Foram todos; chegou tudo ao mesmo tempo!

António Silva insiste e acrescenta para a D. Rosa, face aos demais pretendentes:

-[…] sempre que chegar uma filha do Brasil, pode contar incondicionalmente com o meu telefone […].

Notas:

(1)A tecnologia aqui desfilada é algo posterior a 1942. Contudo, não era, nessa altura, nem é atualmente operada por menores, já que o radioamadorismo, ao contrário do que possa parecer pela designação, é uma atividade que exige estudos técnicos e teóricos, validados por um exame com diploma, passado pela ANACOM – Autoridade Nacional de Comunicações, só acessível a maiores de idade. Outra classe de operadores de radiocomunicações mais simples e mais livre é a designada por Banda do Cidadão, também conhecida por walkie-talkies com menos de 5 watts de potência radiada. Ainda assim resolvi editar esta foto obtida em território português e em homenagem aos Radioamadores, desde os anos 1930`s até ao presente. Radioamadores que muito fizeram em termos de cidadania, em tempos de catástrofes naturais, pondo os seus equipamentos ao serviço público.

(2)Profissional que entrega telegramas.

(3)O percurso final, desde a Estação de Correios e/ou Telegráfica para a morada ou local de trabalho do destinatário é que é feito pelo Boletineiro, ou na falta deste por um Carteiro. 

Fontes:

ANCIÃES, Alfredo Ramos; Património Postal e Telecomunicações-Fernando Moura - FPC Fundação Portuguesa das Comunicações – 100 Anos de Telefone. Lisboa: FPC, 2000

Em linha, acedidos em 27.6.2015:


-Filme Português O Pátio das Cantigas in https://www.youtube.com/watch?v=tZEWhzdWIZY. 



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