quinta-feira, 7 de julho de 2016

49. "ALGARVE D`ALÉM MAR" - ANOTAÇÕES DE UMA VIAGEM

Marrocos, tal como Portugal, têm uma localização relativamente privilegiada no novo mundo em globalização. Ambos são países de entrada e de saída, pelo Mediterrâneo e pelo Atlântico.
 
Foto família/grupo "Associação Beselguense"

Outra característica comum aos dois países é revelada pelos traços culturais onde vivem povos com relações históricas que produziram importante miscigenação, para lá dos negócios, guerra, resgates, pirataria e lendas de belas mouras encantadas e encantadoras.

Existem, ainda, muitos traços genéticos em comum entre os dois povos. De igual modo são evidentes as marcas culturais na origem da língua portuguesa. Alguns milhares de vocábulos são provenientes de povos árabes que se mesclaram com mouros/berberes, lusitanos e outros povos originários ou que passaram pela Península Ibérica. (1)

A distância aérea de Lisboa a Casablanca é de apenas 594 km, com voos diretos de cerca de uma hora ou pouco mais. E se considerarmos a distância aérea entre Faro e Marrocos, via Ceuta, podemos alcançar África e vice-versa em apenas duzentos e tais quilómetros, sensivelmente a mesma distância de Lisboa ao Porto.

O percurso também pode ser realizado de carro, tendo apenas de permeio o estreito de Gibraltar. Esperamos que um dia, no presente século, a travessia possa ser feita por rodovia ou ferrovia através de túnel submarino entre a Península Ibérica e África.

Sobre o Guia que acompanhou a família da Associação Beselguense das Terras do Demo e de Magriço:
De nome Jamal, culto, formado em filologia e estudos hispano-árabes, expressando-se muito bem em castelhano, sabendo usar alguns termos em português. Compreendia quase tudo o que dizíamos na lingua lusa. Perguntei-lhe o que achava da situação atual de relações exteriores e dos conflitos entre o mundo árabe e o cristão ou entre o mundo árabe e o dito mundo ocidental, ao que me respondeu:

-“A raiz dos problemas no Próximo e Médio Oriente e em algumas outras partes do mundo, envolvendo extremistas e o Exército Islâmico, está na política americana dos Bushes, em especial do Bush filho. Eles foram-se meter com o Iraque, vindos de longe. Não estavam sequer em causa reivindicações de territórios ou delimitações de fronteiras. Foi uma agressão gratuita ao mundo islâmico. Estamos todos a pagar a fatura dessa política. O nosso Rei e o Povo marroquino não querem aqui disputas destas influências negativas”.

Marrocos e Portugal:
Somos os mais característicos filhos do “Al Andaluz”, que significa o Ocidente ou Península Ibérica, quando o povo de civilização árabe se fixou em parte da Europa do Sul, África do Norte, Península Arábica, Médio Oriente/Ásia Ocidental.
Acrescentei que Marrocos é, do ponto de vista geofísico, mais ocidental que Portugal Continental, temos a mesma hora oficial e uma herança comum de séculos. Utilizamos alguns milhares de vocábulos com a mesma raiz árabe; as mulheres portuguesas usavam, na quase totalidade, até há poucas décadas, um adereço a envolver a cabeça. Atualmente o lenço ainda é uma peça de distinção nos trajes etnográficos. Temos um espólio de lendas mouras de mulheres de encanto e de tesouros escondidos, deixados pelos mouros, mas a tradição considera, ao mesmo tempo, que a descoberta desses tesouros pode envolver maldição.

O distintivo do Estado marroquino apresenta alguns paralelos com o português do Estado Novo. Nós tínhamos como divisa “Deus, Pátria e Família”, aliado a um modelo de Concordata com a Santa Sé. Por seu lado, o povo marroquino tem um modelo centrado em Deus(ALÁ), Pátria e Rei. Não obstante a islamização da sociedade, o Rei é a melhor garantia da paz e relações com o mundo ocidental. Ele preside diretamente ao Ministério de Assuntos Islâmicos, um órgão estatal da maior importância. A tolerância recíproca com povos que respeitam o islão são uma caraterística deste país que soube democratizar o poder com uma revisão pacífica da Constituição em 2011.

“A monarquia é o pilar institucional de Marrocos. O primeiro artigo da Constituição estipula uma legitimidade estabelecida há séculos: «Marrocos é uma monarquia constitucional, democrática e social"» e o lema do país é: «Deus [ALÁ], Pátria e Rei». O rei é o «Comandante dos Crentes», o Comandante dos Fiéis, e na comunidade islâmica tem uma autoridade moral.” (cf. http://blog_real.blogs.sapo.pt/as-monarquias-monarquia-de-marrocos-...).    

No ultimo dia útil em Marrocos o grupo "Associação Beselguense" foi agraciado surpreendentemente com um jantar e muita animação na Casa das Musas/“Chez Ali” de Marraquexe. Envolveu  receção com cavaleiros trajados. Durante a especial refeição, que contou, entre outros atrativos, com o carneiro, couscous - prato de origem berbere/marroquino; vários grupos desfilaram com sons, trajes e cantares.
Cavalos e cavaleiros atuaram na arena, exibindo seus dotes, fazendo-nos lembrar a Arte e o  “Livro  da Ensinança de Bem Cavalgar Toda a Sela” de D. Duarte que, por sinal, foi Rei de Portugal, do Algarve e Senhor de Ceuta.
As apresentações equestres (agora no campo de amizade) acompanhadas com armas e rajadas de fogo recordaram-nos as lutas de outrora entre a mourama e cristãos.

Durante as viagens e a estadia ocorreram três casos que nos impressionaram:
1-Numa das ruelas da Medina de Fez, plena de vendedores e turistas, fizemos uma compra paga com 50  €uros. Por lapso, deram-nos o troco apenas até cinco euros. Com a confusão de pagar em moeda europeia, e receber a demasia em divisa local, não reparámos no lapso. E não é que o jovem vendedor, ao aperceber-se, passados alguns minutos, “furou” entre a multidão à procura da pessoa que fez a compra, para desfazer o engano e devolver o dinheiro recebido em excesso!

2-Outro conterrâneo deu conta que lhe faltava a carteira onde tinha documentos importantes e algum dinheiro. Após várias buscas descobriram que a carteira não tinha ficado no quarto do hotel. Tinha sim ficado perdida no 4x4 que nos levara até ao deserto de Merzouga-Erfoud. Passado um dia, a carteira foi achada e devolvida ao proprietário que entretanto já se encontrava noutra cidade e hotel a várias centenas de quilómetros.

3-Nos últimos momentos, em subida para o autocarro que nos levaria ao aeroporto de regresso a Lisboa, verificámos a falta de um relógio de estimação. Falámos  com o Guia, que nos deu autorização para voltar à receção e pedir que nos deixasse ir rapidamente ao quarto do hotel. A rececionista atendeu-nos cordialmente e  informou-nos que já haviam ido ao quarto, nada tendo encontrado. Pelo sim pelo não, entregou-nos, delicadamente, um cartão com os contactos do hotel para telefonarmos posteriormente. Eles devolveriam o achado se fosse encontrado. Já em Portugal verificámos que a pulseira do relógio se havia aberto aquando do transporte das malas e caído para dentro de um saco de mão.

Em conclusão: Os objetos perdidos ou esquecidos foram recuperados, contando com a honestidade e amabilidade das pessoas com quem comunicámos.  A história de “Ali Babá e dos 40 ladrões” do mundo árabe e islâmico não parece condizer com o povo que encontrámos. Nada se extraviou e o percurso foi pleno de experiências e conhecimentos.

P.S. Em próximo post abordaremos, em pequenas notas, outros pontos de vista: traje, tradição, animais domésticos, projetos, arte, política, religião, simbologias, relações com Portugal, factos históricos; lenda que deu origem à devoção e ao santuário de Nossa Senhora da Luz de Carnide-Lisboa, expandindo-se por outras partes do mundo, tendo porém, começado em Marrocos.

(1) Atualmente as principais línguas do reino de Marrocos são: o árabe na versão marroquina, aprendido nas escolas. O francês é também estudado e utilizado sobretudo em famílias de estratos populacionais com mais recursos, nos negócios com o exterior e no turismo de origem ocidental. O castelhano, o português (ou portinhol) e o italiano também são bastante escutados nos espaços comerciais e turísticos.

Fontes:
-Al Andalus ou Al-Andaluz  - https://pt.wikipedia.org/wiki/Al-Andalus
-Marrocos informação localização geografia - http://www.marrocos.com/informacoes/localizacao-geografica/;

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