sábado, 12 de janeiro de 2019

DO LOCAL AO UNIVERSAL


Uma questão de Organização

Palavras-Chave: barbarismo, Bento de Núrsia, Escolástica, Europa, Império, matriz, Roma

Pensamos que uma das razões do quase desconhecimento de Escolástica e Bento se deve ao politicamente correto das igrejas, Estado e ensino. O sistema de ensino, ele próprio dependente das políticas de Estado e Governos, não arrisca a ir mais além nos conteúdos. Estas Organizações têm receio em ser mal interpretadas, sobretudo após a separação dos poderes entre Igreja/ Santa Sé e Estado. Idem através das relações com Povos de outras matrizes culturais que não a matriz tipicamente ocidental.

Assim, igrejas, seminários e escolas vivem um certo equilíbrio e distanciamento, o que influencia as pessoas, os estudantes e os investigadores. Grosso modo não se ousa desenvolver teses sobre que espécie de Europa existiria sem o embrião de organização e ensino, criado e implementado por Bento e sua irmã Escolástica.

Estes irmãos gémeos arriscaram criar uma nova forma de ação comunitária e de educação, replicada milhares de vezes pelo espaço europeu.

O movimento prosseguido através das práticas e Regras de São Bento promoveu uma ideia de salvação, não só de almas, como de sustentação de vidas em carências múltiplas pela falta de segurança e de apoio resultante das invasões bárbaras e da decadência do Império Romano.

A história das comunidades conventuais, iniciada com Bento de Núrsia e Escolástica tem mais de 1500 anos de existência (cerca de 498 a 2019).

 

Consideramos aqui cinco pilares essenciais para percebermos a contribuição que o legado de Bento e Escolástica nos deixaram; a saber:

 

I-Oração, II-Trabalho, III-Ação comunitária, IV-Educação, V-Expansão

 

Sem a lenta revolução beneditina, certamente, não haveria Europa, tal como a conhecemos; esta Europa que está em crise mas, ainda assim, é hoje em dia apetecível por gentes de outras geografias; um espaço que veio a “dar mundos ao mundo” e um espaço a que Gilberto Freyre acrescenta com a seguinte frase: «O mundo que o português criou».

Sem prosápias civilizacionais, pensamos que o Mundo poderia estar mais equilibrado: 1 em riquezas, 2 em segurança e 3 em respeito pelo ambiente.

Arriscamos referir cinco marcos históricos para o nascimento e evolução da Europa e para o Mundo, sobretudo o mundo de tradição ocidental europeia:

 

I-Criação de um modelo sociocomunitário por Bento de Núrsia, após a queda de Roma em setembro do ano 476. As Regras que Bento vai criar são, em boa parte, decalcadas nas escrituras bíblicas, já então disponíveis e traduzidas para latim por São Jerónimo (*).

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(*) «Por volta do ano 374, ele [São Jerónimo] foi para a Palestina, onde estudou hebraico e a interpretação da Bíblia. Inspirado por Deus, traduziu todos os livros da Bíblia para o latim, cuja tradução denominou-se “Vulgata, pois o latim era a língua universalmente falada na época»


 

Bento interpretou que o Mundo Ocidental de fim de ciclo imperial romano, tal como o conheceu não tinha qualquer interesse nem viabilidade. Ao criar do início os Conventos na parte ocidental da Europa e redigir o documento organizado em 7 pontos:

 

Título : «REGRA MONÁSTICA

Índice: [1]PRÓLOGO, [2]COMEÇA O TEXTO DA REGRA, [3]OS INTRUMENTOS DAS BOAS OBRAS, [4]OBEDIÊNCIA E SILÊNCIO, [5]HUMILDADE, [6]ORAÇÃO. POBREZA. RECEPÇÃO SOLICITUDE PARA COM OS IRMÃOS. ORDENAÇÃO DO ABADE. DISPOSIÇÕES DIVERSAS e [7]CONCLUSÃO»).

 

Regras estas que seriam a disciplina dos conventos, masculinos e femininos. Da teoria e prática da “Regra Monástica” vai nascer uma organização social - religiosa que vai ter, paulatinamente, reflexos e aplicações na vida dos povos europeus e na expansão para outros continentes.

 

II-Clóvis, o primeiro rei franco convertido, através da sua esposa, é contemporâneo de Bento. Reconhece o valor da organização beneditina e incentiva o seu aproveitamento: Pela prática, pela fé, pelas necessidades de segurança, pela economia e pelo rumo. Os conventos beneditinos vão replicar-se pelo mundo ocidental então conhecido.

 

III-Carlos Magno, já no século oitavo, pensa novamente recriar o império romano do ocidente. Tarde demais. No entanto também reconhece na organização conventual baseada nas regras de Bento de Núrsia, uma importante estrutura e incentiva a prossecução e a difusão entre as comunidades.

 

IV-Já no século onze, o Conde D. Henrique de Borgonha e o seu filho D. Afonso Henriques vêm assumir o comando de um movimento de autonomia e conquista ou reconquista (depende dos pontos de vista). Um novo País está prestes a surgir. O reconhecimento como reino vem a ser feito pelo Papa, até porque: quer o Conde D. Henrique, quer o seu filho incorporam nas suas tropas o contributo de ordens monásticas, algumas tornadas religiosas-militares e religiosas-hospitalárias.

 

V-A expansão para lá do território peninsular começa a torna-se com alguma evidência com D. Dinis que reconverte a Ordem Templária na Ordem de Cristo e inicia programas de fomento da marinha, matas para madeira, construção naval e agricultura.

Com o apoio e organização conventual, os Estados Peninsulares e da Europa laçam-se nos descobrimentos, achamentos, relações comerciais e sociais com os povos. Estas ações vão resultar na globalização.

 

Em nota de conclusão: Os contributos de Bento e Escolástica são quase desconhecidos porque há uma separação pela Concordata e um certo afastamento de práticas e de pontos de vista, evitando os Estados laicos uma coabitação e um alinhamento convergente de ideias com as comunidades religiosas. Jogam pelo dito politicamente correcto.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

DA SALVAGUARDA COMO PROCESSO


Nota Prévia: O recente furto de azulejos do ex Mosteiro de S. Dinis está na ordem do dia de alguns Media e das preocupações de todos os que amam a cultura e os bens culturais de Portugal. Constata-se que não foram tomadas as devidas providências de acautelamento e que a Salvaguarda dos Bens Culturais não é ainda entendida por quem de dever e de direito.



Impunha-se que - com a política de transferência das “Meninas de Odivelas” – do Instituto de Odivelas e dos Serviços do Exército Português que funcionaram, grosso modo, entre 1900 e 2015, transferidos para o Largo da Luz em Lisboa - fossem tomadas medidas para acautelar/salvaguardar os bens que entretanto foram ficando sem a devida vigilância. Daí que a nossa análise estratégica do museu e organizações afins deva ser recordada, nomeadamente no campo da:

 


SALVAGUARDA COMO PROCESSO E NÃO APENAS COMO MERA PONTUALIDADE RECTÓRICA

A salvaguarda materializa-se em ações antecipadas de proteção jurídica e legislativa e diretamente sobre as peças físicas e as peças não tangíveis (ou imateriais), para que um determinado Bem não corra perigo de furto, roubo, vandalismo, dispersão, abandono e degradação.

A salvaguarda implica estudo e, se possível, a classificação dos bens nas instituições de proteção do Património Cultural, por exemplo na DGPC - Direcção-Geral do Património Cultural.

Deve agir-se, tão breve quanto possível, sobre os Bens que estão em perigo real, ou previsível. Deve ter-se em conta os fatores de segurança, a meteorologia, os trabalhos/obras e até os modelos económicos e políticos desfavoráveis; exemplo: o excesso de liberalização económica que leva ao desleixo e à privatização dos Bens de Interesse Público.

A salvaguarda revela-se frequentemente em S.O.S. na medida em que se apresenta como ação urgente.

A salvaguarda é a ação ou ações de salvar em primeiro lugar, acrescida das ações de guardar / vigiar e proteger. (Cf. Vídeo gentileza - chavestv1; You Tube et al – "Museu das Termas Romanas-Chaves" in https://www.youtube.com/watch?v=iCiaAuIB5Xk)

O caso da salvaguarda do “Balneário Romano em Chaves” constitui um conjunto de ações típicas na medida em que permite salvar todos os Bens reveladas. Casos houve, como o do achado do Palácio do 1º Marquês de Marialva e 3º Conde de Cantanhede (a) sob o Largo de Camões em Lisboa que constituiu, em minha opinião, uma salvaguarda minguada na medida em que foram recolhidas algumas peças nas escavações mas relativizou-se o conjunto do edificado arqueológico.

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a)O Marquês de Marialva, António Luís de Meneses foi o patrocinador e financiador do Convento e comunidade de São Pedro de Alcântara (Lisboa) como voto de agradecimento por ter ganho a Batalha dos Montes Claros, ligada ao movimento de Restauração da Independência de Portugal.

 

Idem para o “Fundeadouro Romano de Olisipo” sob a Praça de D. Luís I e também em relação ao Largo do Coreto de Carnide (onde existira uma ermida dedicada ao Espírito Santo. Oficialmente este Largo é chamado Rua Neves Costa) entre outros casos, onde a pressão económica e/ou a urgência em prosseguir as obras projetadas terão acabado por atenuar o valor cultural e consequentemente os trabalhos arqueológicos.

As propostas de musealização entram no âmbito da salvaguarda, incluindo a deslocação dos objetos encontrados (especialmente os mais sensíveis) para locais com melhores condições de preservação.

À salvaguarda prosseguir-se-ão ações de estudo, organização, conservação preventiva, restauro, divulgação, exposição e comunicação.

O documento que venho apresentando para a análise sistémica de patrimónios, organizações museológicas e documentais, servirá para enquadramento de casos reais, como o exemplo seguinte:

Termas Romanas na Cidade de Chaves

Trata-se de uma nova descoberta de equipamento e peças encontradas em bom estado de conservação por se ter dado o acaso de soterramento súbito devido à ocorrência de um sismo há cerca de dezassete séculos.

A Câmara Municipal interveio imediatamente após a descoberta, aquando das obras para um parque de estacionamento automóvel. Desde logo foi notado o relevante valor social do achado e prosseguiram-se as escavações arqueológicas.

Após cerca de dez anos de intervenções, parece aproximar-se o momento da abertura ao público de mais um equipamento museológico considerado raro em todo espaço do antigo Império Romano.

Tal como em Pompeia, ainda que por motivos diferentes (num caso a erupção de um vulcão e no outro um abalo sísmico), o acidente natural permitiu encontrar esqueletos humanos e peças em contexto. Contudo após a alteração das condições que permitiram a conservação in situ torna-se agora necessário acondicionar, conservar e eventualmente restaurar as peças do ex edificado e as móveis, tais como: “anéis, pulseiras” e espólio diverso.

Além de todo o trabalho de salvaguarda prevê-se abrir um museu no local com a ajuda a fundos comunitários. Este equipamento poderá, em minha opinião, juntar-se a outras estruturas termais, junto ao rio Tâmega, também provenientes do Império Romano e que já eram previamente conhecidas, contudo sem a monumentalidade dos recentes achados.

Outra peça ou núcleo museólogo que se lhe poderá juntar é a ponte romana local, integrando os Bens Culturais relacionados entre si, no contexto temporal e social.

Este conjunto de Bens da época romana poderá ser complementado com acréscimo de informação, como se de um museu polinucleado se tratasse. Permitirá às populações locais e aos visitantes um redobrado interesse.

O estudo detalhado dos Bens Culturais aponta para a reposição da funcionalidade dos equipamentos. Nunca se deve abandonar a guarda, deixando os espaços e os Bens de Interesse Social devolutos ou coisa parecida.

 

Palavras-chave: conservação, documentação, informação, musealização, salvaguarda

 

Fontes acedidas em 11.01.2017 e 04.01.2018:

--ANCIÃES, Alfredo  -


--DN et al - «Sismo "congelou no tempo" balneário romano em Chaves», - http://www.dn.pt/artes/interior/sismo-congelou-no-tempo-balneario-romano-em-chaves-5444320.html , 5.10.2016 ;

--DN, et al - «Chaves candidata-se a 800 mil euros da Europa para fazer museu» http://www.dn.pt/artes/interior/chaves-candidata-se-a-800-mil-euros-da-europa-para-fazer-museu-5444504.html, 15.10.2016 ;

--MOREIRA, Cristina Faria “Azulejos do século XVIII estão a ser roubados do Mosteiro de Odivelas”, Jornal Público, 03.01.2019, também disponível em  https://www.publico.pt/2019/01/03/local/noticia/roubados-centena-azulejos-mosteiro-odivelas-1856590

--PORTUGAL, Lusa et al – “Azulejos do séc. XVIII furtados do Mosteiro de Odivelas”, também disponível em https://www.noticiasaominuto.com/pais/1173203/azulejos-do-seculo-xvii-furtados-do-mosteiro-de-odivelas

--PORTUGAL, Youtube et al  https://www.youtube.com/watch?v=-jG-n4Kj11g , 21.11.2014

--PORTUGAL,  Chavestv1 et al - Museu das Termas Romanas https://www.youtube.com/watch?v=iCiaAuIB5Xk

--PORTUGAL - IGESPAR, I.P. Extensão de Trás-os-Montes et al – «Balneário Termal Romano (Chaves)» http://www.patrimoniocultural.pt/media/uploads/arqueologiapreventivaedeacompanhamento/chaves.pdf , sd.;

PORTUGAL, Igreja – Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura - https://www.snpcultura.org/ordem_cister_heranca_cultural_portugal_europa.html

WIKI et al - https://pt.wikipedia.org/wiki/Mosteiro_de_São_Dinis , acedido em 04.01.2019