sexta-feira, 31 de julho de 2015

49. "ALGARVE D`ALÉM MAR" - ANOTAÇÕES DE UMA VIAGEM




Marrocos, tal como Portugal, têm uma localização relativamente privilegiada no novo mundo em globalização. Ambos são países de entrada e de saída, pelo Mediterrâneo e pelo Atlântico.
 
 



 






A distância aérea de Lisboa a Casablanca é de apenas 594 km, com voos diretos de cerca de uma hora ou pouco mais. E se considerarmos a distância aérea entre Faro e Marrocos, via Ceuta, podemos alcançar África e vice-versa em apenas duzentos e tais quilómetros, sensivelmente a mesma distância de Lisboa ao Porto.

O percurso também pode ser realizado de carro, tendo apenas de permeio o estreito de Gibraltar. Esperamos que um dia, no presente século, a travessia possa ser feita por rodovia ou ferrovia através de túnel submarino entre a Península Ibérica e África.

Sobre o Guia que acompanhou a família da Associação Beselguense das Terras do Demo e de Magriço:

De nome Jamal, culto, formado em filologia e estudos hispano-árabes, expressando-se muito bem em castelhano, sabendo usar alguns termos em português. Compreendia quase tudo o que dizíamos na lingua lusa. Perguntei-lhe o que achava da situação atual de relações exteriores e dos conflitos entre o mundo árabe e o cristão ou entre o mundo árabe e o dito mundo ocidental, ao que me respondeu:

-“A raiz dos problemas no Próximo e Médio Oriente e em algumas outras partes do mundo, envolvendo extremistas e o Exército Islâmico, está na política americana dos Bushes, em especial do Bush filho. Eles foram-se meter com o Iraque, vindos de longe. Não estavam sequer em causa reivindicações de territórios ou delimitações de fronteiras. Foi uma agressão gratuita ao mundo islâmico. Estamos todos a pagar a fatura dessa política. O nosso Rei e o Povo marroquino não querem aqui disputas destas influências negativas”.

Marrocos e Portugal:

Somos os mais característicos filhos do “Al Andaluz”, que significa o Ocidente ou Península Ibérica, quando o povo de civilização árabe se fixou em parte da Europa do Sul, África do Norte, Península Arábica, Médio Oriente/Ásia Ocidental.

Acrescentei que Marrocos é, do ponto de vista geofísico, mais ocidental que Portugal Continental, temos a mesma hora oficial e uma herança comum de séculos. Utilizamos alguns milhares de vocábulos com a mesma raiz árabe; as mulheres portuguesas usavam, na quase totalidade, até há poucas décadas, um adereço a envolver a cabeça. Atualmente o lenço ainda é uma peça de distinção nos trajes etnográficos. Temos um espólio de lendas mouras de mulheres de encanto e de tesouros escondidos, deixados pelos mouros, mas a tradição considera, ao mesmo tempo, que a descoberta desses tesouros pode envolver maldição.

O distintivo do Estado marroquino apresenta alguns paralelos com o português do Estado Novo. Nós tínhamos como divisa “Deus, Pátria e Família”, aliado a um modelo de Concordata com a Santa Sé. Por seu lado, o povo marroquino tem um modelo centrado em Deus(ALÁ), Pátria e Rei. Não obstante a islamização da sociedade, o Rei é a melhor garantia da paz e relações com o mundo ocidental. Ele preside diretamente ao Ministério de Assuntos Islâmicos, um órgão estatal da maior importância. A tolerância recíproca com povos que respeitam o islão são uma caraterística deste país que soube democratizar o poder com uma revisão pacífica da Constituição em 2011.
 







Durante as viagens e a estadia ocorreram três casos que nos impressionaram:

1-Numa das ruelas da Medina de Fez, plena de vendedores e turistas, fizemos uma compra paga com 50  €uros. Por lapso, deram-nos o troco apenas até cinco euros. Com a confusão de pagar em moeda europeia, e receber a demasia em divisa local, não reparámos no lapso. E não é que o jovem vendedor, ao aperceber-se, passados alguns minutos, “furou” entre a multidão à procura da pessoa que fez a compra, para desfazer o engano e devolver o dinheiro recebido em excesso!

2-Outro conterrâneo deu conta que lhe faltava a carteira onde tinha documentos importantes e algum dinheiro. Após várias buscas descobriram que a carteira não tinha ficado no quarto do hotel. Tinha sim ficado perdida no 4x4 que nos levara até ao deserto de Merzouga-Erfoud. Passado um dia, a carteira foi achada e devolvida ao proprietário que entretanto já se encontrava noutra cidade e hotel a várias centenas de quilómetros.

3-Nos últimos momentos, em subida para o autocarro que nos levaria ao aeroporto de regresso a Lisboa, verificámos a falta de um relógio de estimação. Falámos  com o Guia, que nos deu autorização para voltar à receção e pedir que nos deixasse ir rapidamente ao quarto do hotel. A rececionista atendeu-nos cordialmente e  informou-nos que já haviam ido ao quarto, nada tendo encontrado. Pelo sim pelo não, entregou-nos, delicadamente, um cartão com os contactos do hotel para telefonarmos posteriormente. Eles devolveriam o achado se fosse encontrado. Já em Portugal verificámos que a pulseira do relógio se havia aberto aquando do transporte das malas e caído para dentro de um saco de mão.

Em conclusão: Os objetos perdidos ou esquecidos foram recuperados, contando com a honestidade e amabilidade das pessoas com quem comunicámos.  A história de “Ali Babá e dos 40 ladrões” do mundo árabe e islâmico não parece condizer com o povo que encontrámos. Nada se extraviou e o percurso foi pleno de experiências e conhecimentos.

P.S. Em próximo post abordaremos, em pequenas notas, outros pontos de vista: traje, tradição, animais domésticos, projetos, arte, política, religião, simbologias, relações com Portugal, factos históricos e a lenda que deu origem à devoção e ao santuário de Nossa Senhora da Luz de Carnide-Lisboa, expandindo-se por outras partes do mundo tendo, porém, começado em Marrocos.

 

 







  

sexta-feira, 10 de julho de 2015

48. COMUNICAÇÕES D`OUTRORA E UMA PERSPETIVA DE FUTURO – O CASO DE J.C.BOSE

 
(1)

          Jagadish Chandra Bose (2) nasceu e faleceu na Índia (1858 -1937)

Na época de Bose, a telegrafia elétrica (transmissão da escrita à distância através de fios condutores) já havia sido inventada e implementada. Idem quanto à telefonia tradicional. Contudo, a radiotelegrafia e a radiotelefonia, só nos finais do século XIX/ início do XXº dão sinais de vida. Neste processo, Bose exerceu meritórias ações, as quais nunca será demais destacar.

As investigações de Bose e do físico Édouard Branly (Amiens, 1844 – 1940, Paris) foram quase simultâneas e, provavelmente, independentes uma da outra. Branly foi o primeiro, do ponto de vista do registo de patente com o detetor (dito coesor de Branly), enquanto Bose inventou peça semelhante mas conformou-se com a divulgação no sistema de ensino e no emprego da mesma peça em explosões de pedreiras e também nos sinais em campainhas por via radioelétrica. Bose estava mais interessado na segurança de vidas humanas e na divulgação do conhecimento, através do ensino que ministrava, do que em realizar proventos pela venda de serviços e equipamentos.

A sua genialidade como físico, biofísico, botânico, fisiologista e arqueólogo, foi direcionada para a relação humanista. Altruísta, parece ter descurado o desenvolvimento na vertente das comunicações, deixando o caminho aberto para outros investigadores, tal como veio a acontecer, com a evolução das telecomunicações inclusivamente na Era digital. Bose iniciou a investigação que viria a dar frutos com os semicondutores, base das comunicações modernas/atuais à distância.

Mais interessado pelos fenómenos da vida e desta com o Absoluto (3), Bose privilegia o estudo da relação homem/meio ambiente. Para Bose, a natureza vegetal não é desprovida de sensações de bem-estar, mal-estar; não é indiferente a estímulos. Uma planta pode sentir a presença de bons e maus fluídos e reage a sensações e comunicações.

Tudo parece indicar, que o reino vegetal comunica com o meio, libertando odores e desenvolvendo-se ou retraindo-se no seu crescimento e morte; na frutificação abundante e generosa, ou no definhamento e esterilidade.

Para comprovar os atributos de sensação/reação, felicidade/bem-estar que a sua intuição e espírito lhe sugeriam, Bose inventa um equipamento a que chama crescógrafo (4) permitindo a ampliação, das manifestações reativas/comunicativas do reino vegetal, até cerca de 10.000 vezes.

Dada a sua personalidade de polígrafo, Bose dedica-se mais ao ensino dos princípios e fundamentos do que às questões formais e autorais. Filho de um magistrado, estuda em Calcutá, a partir dos 9 anos, onde conclui uma licenciatura. Em 1880 já se encontra em Londres onde segue Medicina, que não conclui devido a ter desenvolvido uma doença de malária. Muda de curso e licencia-se em Física. Entre vários professores encontra Francis Darwin, filho do célebre Charles Darwin.

Regressa a Calcutá onde trabalha cerca de 30 anos. Leciona e investiga no Presidency College e é nas duas últimas décadas do século XIX que realiza várias investigações, entre elas: sobre ondas eletromagnéticas, precedendo Marconi.

Nestes anos consegue fazer explodir uma carga à distância, através do espaço radioelétrico, isto é, sem o uso de fios e faz tocar uma campainha, também sem o recurso de traçados contínuos. Estavam dados os passos essenciais para as radiocomunicações. Em 1896 o Daily Chronicle relata a experiência da sua comunicação à distância, sem fios.

Quase pela mesma altura o russo Alexander Popov, também realiza experiências no sentido de comunicar por via radioelétrica. Mas Popov escreve em 1895 que mantinha a esperança de comunicar, sem fios; logo verifica-se que, neste ano de 1895, ainda não tinha conseguido o seu desiderato. Quanto a Marconi, também só em 1897 consegue resultados aceitáveis e encorajadores.

Bose não teve intenção em manter em segredo a sua investigação. Não o movia o desígnio de criação de empresas e negócios, apenas a divulgação científica entre a população interessada. Mas não faltava quem por interesses pessoais, quiçá egoístas, quisesse apresentar inovações. Ele próprio desabafa com um amigo poeta, e igualmente polígrafo de Calcutá - Rabindranath Tagore, em 1901, sobre o espírito de ganância pelo dinheiro que encontra em obcecados concorrentes.

Bose investiga e trabalha sobre as ondas curtas que estão na base da revolução das comunicações a longas distâncias. Inventa um protótipo de díodo (5) semicondutor de cristais, funcionando como peça transmissora de informação e descobre as micro ondas.

A este respeito estava tão avançado em relação ao seu tempo que o Prémio Nobel de Física de 1977 – Nevill Mott confirma que Bose estava “60 anos avançado em relação à sua época”(6).

Notas:

(1)Proveniência e gentileza da imagem: Royal Institution Jagadish Chandra Bose e, EMERSON, D. T in https://www.cv.nrao.edu/~demerson/bose/bose.html; es.wikipedia

(2)É interessante o termo bose por estar associado ao “pequeno e discreto” (cf. http://mundodasmarcas.blogspot.pt/2006/05/bose-better-sound-through-research.html, https://pt.wikipedia.org/wiki/Condensado_de_Bose-Einstein). O bosão, por sua vez, ganhou o significado de “a partícula mais pequena de Deus”. O nome Bose parece ter sido inspirado aos seus progenitores. Porém, Bose, originário de um território colonizado tornou-se grande, não só na India, como na Metrópole, G. B., e no Mundo, estando hoje as suas obras, e as que dele falam, traduzidas em cerca de 20 línguas.

(3)A expressão Absoluto é aqui empregu em vez de Deus, Javé e Alá, cujas referências estão ainda ligadas a religiões e culturas diferentes, o mais das vezes em competição ou em guerra declarada.

(4)Crescógrafo - substantivo masculino do latim cresco, crescer + grafo, registo, isto é, aparelho amplificador e registador do crescimento das plantas. (cf. Dicio – Dicionário Online português). Diz-nos o guru indiano Paramahansa Yogananda, na sua obra onde se refere a Bose, que este precursor “recebeu o título de Cavaleiro pela Administração Britânica, em 1917, pela invenção do crescógrafo”, entre outros instrumentos. (cf. YOGANANDA: 2007).

(5)Díodos (do grego di e odos = dois caminhos). Trata-se de pequenas peças trabalhando com cristais. Estas pequenas unidades são, hoje em dia, mais conhecidas como semicondutores. Assentam na capacidade variável de conduzir a corrente elétrica. Os cristais foram primeiramente descobertos em 1873-1874 por Frederick Guthrie e Karl Braun. Depois utilizados por Thomas Edison (1880). Pouco tempo após, são aplicados por Édouard Branly e Jagadish Bose, no então chamado coesor de transmissão radioelétrica. A progressão tecnológica continua e são inventadas as válvulas termoiónicas, constituídas essencialmente por um cátodo, um filamento e um ânodo. O aquecimento do filamento faz trabalhar iões e eletrões, bem assim como o encaminhamento de impulsos informativos. Novas evoluções e as válvulas dão lugar aos transístores e atualmente aos circuitos integrados. Porém, a origem da transmissão radioelétrica, baseia-se nos coesores/díodos (duas funções). Também não será por acaso que os sistemas atuais de comunicações se chamam digitais por se basearem na transmissão de zeros e uns. Hoje, como no século XIX, as comunicações são baseadas na dualidade, tal como uma moeda possui duas faces. Para se comunicar são necessárias no mínimo duas pessoas ou uma pessoa e outro ser, seja animal, vegetal e talvez também se possa vir a comunicar com o reino mineral e o espiritual. Seguindo o precursor Bose, parece que a comunicação entre seres de espécies diferentes já está ao alcance da Humanidade mas é como diz uma citação trazida pela cara amiga Lucinda: a comunicação é como “A felicidade [que] bate na porta mas não gira a maçaneta. Quem decide se quer que ela entre ou não, é você!”. (Cf. http://comunidade.sol.pt/blogs/lucinda/archive/2015/07/06/OS-GREGOS-E-A-SUA-SEDE-DE-UMA-JUSTA-DEMOCRACIA_2E00_.aspx )


 
Tags: BOSE,Jagadish Chandra, BRANLY,Edouard, Crescógrafo, Díodo-semicondutor, Radiocomunicações, Radiotelefonia, Radiotelegrafia, Telecomunicações, TSF, MARCONI,Guglielmo, POPOV,Alexander, YOGANANDA,Paramahansa

 
Fontes bibliográficas:

-COPERÍAS, Enrique M. – O Livro das origens: De onde vem tudo o que nos rodeia, do Universo e da vida aos objetos do quotidiano. Paço de Arcos: Abril /Controljornal Edipress, Ldª, 2013

Documentos policopiados

-ANCIÃES, Alfredo Ramos – Ensaio de Organização da Telegrafia Eléctrica no Museu dos CTT. Lisboa: Museu dos CTT; UAL, 1988- 1989.- Policopiado

-ANCIÃES, Alfredo Ramos – Uma (R)evolução nas Telecomunicações. Lisboa: FPC – Fundação Portuguesa das Comunicações, 2005. – Doc. policopiado de apresentação da Exposição “150 Anos da Telegrafia Elétrica em Portugal”. In Património Museológico Postal e Telecomunicações

Documentos em linha, acedidos em 7.7.2015


-BOSE, Jagadish Chandra - Biografia - pioneirismo na pesquisa/deteção de ondas curtas in http://ethw.org/Jagadish_Chandra_Bose


-BOSE - Físico e Fisiologista in http://es.wikipedia.org/wiki/Jagdish_Chandra_Bose


-BOSE; Demerson - Detetor ou coesor radioelétrico in https://www.cv.nrao.edu/~demerson/b~ose/bose.html

-CHARDIN – Investigações sobre a energética do pensamento e o respito pela Natureza in http://pt.wikipedia.org/wiki/Teilhard_de_Chardin#Obras_de_Teilhard_de_Chardin

-CHT Comissão das História das Transmissões - BRANLY, Édouard e o coesor detetor de ondas radioelétricas in https://historiadastransmissoes.wordpress.com/tag/coesor-de-branly/ ; https://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%89douard_Branly; https://en.wikipedia.org/wiki/%C3%89douard_Branly ;

-Diodo semicondutor de cristais in https://pt.wikipedia.org/wiki/Diodo_semicondutor

-EMERSON, D. T. – Investigações pioneiras de J. C. Bose: 100 anos de ondas milimétricas e relação com as investigações de Bose in https://www.cv.nrao.edu/~demerson/bose/bose.html

-FIDALGO, Anabela (profª) - Apontamentos aulas de Literatura. Massamá e Monte Abraão: USMMA, 2014/2015

-FRANCISCO, Papa – Nova Encíclica “Laudato si, sobre o cuidado da Terra in http://ionline.pt/397268?source=social

-JANEIRA, Ana Luisa – Teilhard de Chardin: a energética como visão de mundo; A energia máxima será sempre o amor in https://teilhardianos.wordpress.com/2012/05/25/teilhard-de-chardin-a-energetica-como-visao-de-mundo/



-PEREIRA, Martha Camargo Vasconcelos - Efeito Branly (Branly's coherer). Campinas: Universidade Estadual de Campinas - Instituto de Física Gleb Wataghin, s. d. in http://www.ifi.unicamp.br/~lunazzi/F530_F590_F690_F809_F895/F809/F809_sem2_2006/MarthaC_Tamashiro_RF1.pdf

-KAMERLINGH-ONNES, Heike – História do forno de micro-ondas in http://microwavecooking.com/pt/Microwave_Oven_History_Part3.htm


-YOGANANDA, Paramahansa ; BOSE, Jagadish in https://pt.wikipedia.org/wiki/Autobiografia_de_um_Iogue

-YOGANANDA, Paramahnsa – Autobiografia de um Iogue [e a relação com Bose]. [Lisboa?]: Dinalivro, 2007. À venda na FNAC. O original foi traduzido do inglês em 18 línguas, incluindo o português.
 

quarta-feira, 1 de julho de 2015

47. MEIOS E TECNOLOGIAS DE COMUNICAÇÃO NO FILME - “O PÁTIO DAS CANTIGAS”

       O Pátio das Cantigas é um filme clássico português, realizado em 1942. As festas populares de junho, prosseguidas pelas estivais dão-lhe o mote. Neste filme entra uma trilogia de célebres atores: Vasco Santana (Narciso), António Silva (Evaristo) e Ribeirinho (Rufino), entre outros. O género é de comédia. O valor histórico tem determinado a sua reposição, inclusivamente a sua reedição que terá a estreia, com atores atuais, em finais de julho do corrente ano de 2015.

Vamos ver como vai ser aceite pelo público, sendo que o título e a imagem original lhe dão projeção. Por outro lado, é uma imensa responsabilidade trabalhar sobre uma marca e atributo que tem sido de grande aceitação.

Imagem de contexto em 1942
      Sob o ponto de vista das tecnologias de animação e comunicação começamos por Carlos Alves (Sr. Engenhocas) que vivia num prédio do Pátio das Cantigas e lidava com vários equipamentos, entre eles: uma grafonola e altifalante de sacada. Punha toda a gente alegre e a dançar. A casa do Sr. Engenhocas era ainda equipada com um aparelho de rádio que o próprio Engenhocas diz ter inventado; um telefone automático de mesa modelo de coluna e um telefone de parede, modelo Herrmann/português com adaptação de bateria local e chamada por magneto (manivela).

A Srª Rosa (Maria das Neves) é avisada de que chegou a sua filha do Brasil.

Do Pátio das Cantigas, presumidamente na Ajuda, à Praça da Figueira são utilizados cinco meios de transmissão da comunicação:

Primeiro admirador e primeiro meio de comunicação: O Evaristo tenta o contacto com a Srª Rosa por telefone. Concretamente trata-se de um telefone automático modelo de coluna, com marcador de disco rotativo. Os primeiros telefones automáticos haviam sido inaugurados em 1930, em Lisboa. Porém, em 1942 (data do filme O Pátio das Cantigas) a telefonia automática, sem necessidade de Telefonista, ainda se limitava a Lisboa e circunvizinhança. Também no Porto, havia uma zona da cidade e envolvimento, então explorada pela APT – The Anglo-Portuguese Telephone Company, Limited que precedeu os TLP – Telefones de Lisboa e Porto. Fora destas zonas, quase todo o território nacional, explorado pelos CTT, utilizava ainda os telefones manuais de bateria local, isto é com grossas pilhas e manivela para chamada da Telefonista que, por sua vez, comutava a ligação entre os utilizadores: chamadores e chamados.
Imagem publicidade “cartaz publicitário de Cunha Barros/APT” in Arq. da Fundação Portuguesa das Comunicações. Dois telefones deste tipo foram utilizados nas gravações d` O Pátio das Cantigas

Acontece que a prática em utilizar os telefones automáticos era escassa e a tecnologia também não seria muito eficaz. O Evaristo, antes de conseguir ligação com a Srª Rosa, engana-se quatro vezes a marcar o número ou foi afetado pelo cruzamento involuntário de linhas. Na primeira vez a comunicação vai parar à Maternidade Alfredo da Costa; noutra tentativa vai parar à Escola Agrícola da Paiã (Pontinha-Odivelas); nova tentativa vai para o Jardim Zoológico; outra tentativa ainda, vai parar à Praça de Touros do Campo Pequeno. Só à quinta vez, o Evaristo liga ao calha tentando números, mesmo sem olhar para o disco. E não é que, desta vez, acerta a ligação!

A Srª Rosa atende o telefone na Praça da Figueira. Para agradarem à Florista, os outros admiradores, também tentam as suas sortes com meios de transmissão diferentes. E tudo se baralha!

Segundo admirador e segundo meio: O Evaristo envia um pombo-correio com uma mensagem que chega ao mesmo tempo da chamada telefónica. A Srª Rosa fica tão emocionada ao ver o seu pombinho “fofinho [que lhe] traz um recado”. E deixa o aparelho telefónico a falar sozinho, não conseguindo atender o admirador com a nova da chegada da filha, do Brasil.
Por sua vez, Narciso diz para o pombo-correio “Vai depressa para mostrar que o melhor telégrafo ainda é o pombalino” (de pombo-correio).


Pombo-correio
     Terceiro admirador e terceiro meio: Tudo numa questão de segundos ou micro segundos, chega a informação via radiodifusão através dum aparelho que o Radioamador - Sr. Engenhocas emprestara à Srª Rosa. A mensagem da rádio era muito simples: “Srª Rosa chegou a sua filha”.

Desfile etnográfico de Radioamadores na Horta – Faial em 2014 (1).

Quarto admirador e quarto meio: Entretanto chega um Boletineiro (2) com a mensagem que havia sido emitido nos Correios, hipoteticamente da freguesia da Ajuda ou de Belém; vizinhas do Pátio das Cantigas, onde o expedidor dera a indicação de que fosse transmitido depressa (3).


Ciclista Boletineiro no Terreiro do Paço
      Quinto admirador e quinto meio: Uma mensagem verbal chega através dum miúdo a pé. Quando a criança aborda a Srª Rosa, o Mensageiro não consegue falar de tanta emoção e/ou cansaço e é a própria D. Rosa que se antecipa à voz do menino dizendo:

- Já sei, chegou a minha filha!

No final comparecem todos os admiradores a reivindicar, cada um, a primícia da chegada da mensagem com intenção de ficarem bem vistos.

- Não é verdade que quem lhe deu primeiro a notícia foi o meu pombo, que por acaso é seu?! - pergunta o Narciso.

Porém, a mui pretendida dama atalha dizendo para os pretendentes:

-Foram todos; chegou tudo ao mesmo tempo!

António Silva insiste e acrescenta para a D. Rosa, face aos demais pretendentes:

-[…] sempre que chegar uma filha do Brasil, pode contar incondicionalmente com o meu telefone […].

Notas:

(1)A tecnologia aqui desfilada é algo posterior a 1942. Contudo, não era, nessa altura, nem é atualmente operada por menores, já que o radioamadorismo, ao contrário do que possa parecer pela designação, é uma atividade que exige estudos técnicos e teóricos, validados por um exame com diploma, passado pela ANACOM – Autoridade Nacional de Comunicações, só acessível a maiores de idade. Outra classe de operadores de radiocomunicações mais simples e mais livre é a designada por Banda do Cidadão, também conhecida por walkie-talkies com menos de 5 watts de potência radiada. Ainda assim resolvi editar esta foto obtida em território português e em homenagem aos Radioamadores, desde os anos 1930`s até ao presente. Radioamadores que muito fizeram em termos de cidadania, em tempos de catástrofes naturais, pondo os seus equipamentos ao serviço público.

(2)Profissional que entrega telegramas.

(3)O percurso final, desde a Estação de Correios e/ou Telegráfica para a morada ou local de trabalho do destinatário é que é feito pelo Boletineiro, ou na falta deste por um Carteiro. 

Fontes:

ANCIÃES, Alfredo Ramos; Património Postal e Telecomunicações-Fernando Moura - FPC Fundação Portuguesa das Comunicações – 100 Anos de Telefone. Lisboa: FPC, 2000

Em linha, acedidos em 27.6.2015:


-Filme Português O Pátio das Cantigas in https://www.youtube.com/watch?v=tZEWhzdWIZY.