sábado, 26 de abril de 2014

08 A Comunicação pela Arte - O Caso de Olinda e Malangatana

Nota prévia: O presente artigo foi, outrora, publicado no post (1) agora adaptado na ótica da arte e comunicações.

Benedictus dominus Deus noster qui dedit nobis Signum [Bendito seja Deus Nosso Senhor que nos deu (ou dedicou) o Sinal (Signo, Filho, Verbo,  O Comunicador)] (2).

Consideramos que a arte é essencialmente uma forma de comunicar, o que o criador sente e expressa, a um público que observa e interpreta. Enquanto veiculo de expressão e comunicação, a arte está relacionada com conhecimentos e saberes. A interpretação de uma obra de arte varia de acordo com as ferramentas com que a deciframos. Recorde-se que o termo decifrar deriva de cifra (oculto/secreto), assim o verbo transitivo decifrar significa descobrir, tornar compreensível. É isso que as exposições de arte têm ou deverão ter como objetivo, para lá do deleite.

O exemplo de Olinda Gil e de um dos seus inspiradores, Malangatana: Olinda Gil é leão de signo. A costela beirã de nascença (Covilhã) dá-lhe o sentido da luta (3). Aos 5 anos, Olinda vai para África. As terras de Nacala, ao norte de Moçambique, acabam por moldar-lhe o carácter.

A informalidade e a descontracção de influência africana são marcas, a par da sensibilidade para as artes que colhe junto da galeria de que seu pai é proprietário, em Moçambique. Uma galeria de arte, neste ponto do hemisfério, tem de apostar nos recursos locais, isto é, nos artistas nativos e naqueles que são capazes de captar a alma do povo e do território.

O carácter herdado na infância e juventude no seio da família e no meio social são essenciais para a absorção de conhecimentos que Olinda manifesta, quer na sua pena, quer na tela e pincel.

A meu ver não podemos dissociar Olinda de Malangatana (conhecidos e amigos) a começar pela Terra comum (Moçambique) que lhes serviu de berço e de vivência. Em ambos há a prevalência das representações humanas colectivas e uma cultura baseada na religiosidade do mundo judaico-cristão. Malangatana com uma prática muito desenvolvida e uma grande dedicação à pintura consegue quadros com uma carga muito densa e com semelhanças a um Picasso, passando pela estilização e formas distorcidas propositadamente. 

As cores são quentes, quer no distinto Malangatana, quer em Olinda. Apostam nos vermelhos simbolizadores de vida e energia. A religiosidade e o simbolismo são presença frequente em ambos. Em Olinda há vários elementos da cultura judaico-cristã na virgem e nos santos e até em vários quadros com a presença da serpente. Porém, a serpente em Olinda não é um animal que rasteja mas sim um elemento decorativo, simbólico, tal como é apresentado na Farmacologia e na Medicina.

A formação em História e Ciências Sociais dão a Olinda uma recorrência a temáticas que transcendem a arte pela arte e a contemporaneidade. Entre os vários quadros de Olinda escolhemos, quase ao acaso: “Homenagem a Malangatana”. Neste quadro Olinda representa o elemento social com rostos coloridos e olhos frequentemente amendoados que dão uma sensação de tranquilidade e beleza. 

Em “Oasis”. Uma pintura quase minimalista em que apresenta o essencial com cores onde se sente o fogo da vida e a água que refresca. O natural, o ideal e a evasão ao bulício da vida urbana estão ali presentes.

Em “Peixes”. Temos novamente a vivacidade da paleta de cores quentes mas também as refrescantes e de sonho no avermelhado, azul, verde e rosa. É de notar que o peixe é um dos símbolos cristãos. A água, fonte de vida, está habitada por peixes que se cruzam pacificamente, cada um em seu próprio percurso, delimitado por linhas onduladas.

Na “Virgem das Borboletas”. A autora manifesta uma simbiose entre a natureza representada pelas borboletas e o fundo cheio de flores, com a santidade (virgem com o menino). O vestido decorado com desenhos de faixas geométricas, atiram para uma influência da pintura das sociedades da pré e pro-história. O conjunto pictórico central encontra-se protegido de influências exteriores. Há como que uma redoma a dividir o desenho temático do ambiente exterior.

Em “The Seagull Princess”. Olinda representa mais uma vez um mundo ideal em que no centro figura uma princesa praticamente desnuda. Um palácio, árvores, pássaros e uma mão aberta, que se aproxima duma ave, complementam o sonho.

É de notar a criatividade e a intensa atividade da nossa amiga bloguista no blogue “Sol” (4). É de “invejar” a sua capacidade de realização entre a sua vida profissional, doméstica, artística e difusora de conhecimentos nos “blogues”, no “Facebook” e, quiçá, na sua vida social quotidiana.


(2) in  Mensagem / Fernando Pessoa. Lisboa: Editorial Império; Livraria do Dr. Pedro de Moura e Sá, 1934, p.7

(3)Tal como diziam Arnold Toynbee (Inglaterra, 1889-1975) e Fernand Braudel (França, 1902-1985) citados frequentemente por João Evangelista (não o santo mas um professor que tive em Geo-História) a serra dá ao ser humano pernas e um sistema respiratório musculados para que consigam fazer face aos desafios e aos desníveis orográficos que permanentemente têm que vencer.

(4) Endereço do blogue de Olinda Gil in http://comunidade.sol.pt/blogs/OlindaGil/default.aspx, acedido em 26.4.2014

Outras e fontes:

Anciães, Alfredo. Disponível em  http://comunidade.sol.pt/blogs/alfredoramosanciaes/default.aspx, acedido em 26.4.2014

Galeria de Arte e Signos; Pérola de Cultura / Olinda Gil, disponível em:



Introdução Geral à Filosofia da Arte / Evaldo Pauli, disponível em:


O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrânico / Fernand Braudel, disponível em:

Teorias da Comunicações / Mauro Wolf. Lisboa: Editorial Presença, 1987  

Um estudo de História / Arnold Toynbee, disponível em:


Para mais fotos da Olinda consultar sua página do facebook: http://www.facebook.com/linda.girassol