sexta-feira, 26 de setembro de 2014

18 RAIZES E FUNDAMENTOS PARA UM FUTURO MUSEU NACIONAL DAS COMUNICAÇÕES E TRANSPORTES



Para que a jornada da vida valha a pena, arranja tempo para brincar, ler, viajar, trabalhar, cuidar, descansar, divertir, amar e comunicar. (Pensamentos AA, 2014)

Organização e Política Museológica ao Tempo do Estado Novo

Em 19 de julho de 1952, a cerca de cinco meses após a exoneração de Mário Gonçalves Viana, I conservador, é nomeado o II conservador-chefe. Trata-se de António Mora Ramos que esteve à frente do Museu dos CTT até 6.8.1958, tendo-se desencadeado com este conservador um processo algo semelhante ao do I conservador, devido às mesmas questões de acumulação de funções e de vencimento, como professor do ensino técnico. Deste modo, também Mora Ramos opta por deixar o Museu e os CTT.

No tempo em que Mora Ramos dirige o museu, inaugura-se a 1ª exposição, patente a todo o público, na Rua das Picoas, nº 7, 2º andar onde são expostos espécimes da coleção postal. A primeira exposição com espécimes de telecomunicações viria a ter lugar no ano seguinte (1959), num edifício dos CTT da Rua Castilho e já com a Dr.ª Maria da Glória Pires Firmino, que viria a ser designada conservadora-chefe, substituindo António Mora Ramos.

Em relação à secção de telecomunicações Mora Ramos deixou a exposição pronta a ser exibida, tanto quanto nos informa o seguinte extrato: “No campo telegráfico e telefónico tem já o museu instalações definitivamente montadas, com os aparelhos aptos a funcionar, prontos a mostrar aos empregados e ao público como executam o seu serviço. Foi um trabalho que levou anos, mas, de facto, valeu a pena” (1).

E prosseguindo esta transcrição de Mora Ramos podemos verificar que, não obstante o museu “começar apenas a definir os seus contornos”, são várias as realizações que se devem a este conservador que subiu, “palmo a palmo” a escala socioprofissional, a trabalhar e estudar simultaneamente. Diz-nos Mora Ramos quase no início da sua gestão do Museu que: “Muitas outras montagens estão em curso ou aguardam ocasião – miniaturas de transportes, de instalações técnicas, de serviços, representações esquemáticas, etc.” (2) 

Além destas realizações referidas pelo próprio Mora Ramos, destacamos: A transferência do museu, em 1954, da Rua de São Mamede (ao Caldas), nº 17 para instalações mais espaçosas na Av. Fontes Pereira de Melo nº 26 – 1º; a montagem do setor postal no 2º andar da Rua das Picoas, nº 7 – A, cuja inauguração se realizou em 1958; a preparação e montagem do setor de telecomunicações na Rua Castilho, nº 15 – 2º, cuja inauguração, desta exposição a que Mora Ramos dedicara tantos esforços, não teve o prazer de assistir, uma vez que foi exonerado, a seu pedido, de conservador-chefe do museu em 6 de agosto de 1958, tendo a exposição de telecomunicações da Rua Castilho sido inaugurada no ano seguinte ao da sua exoneração (1959).

Integravam esta exposição, além dos espécimes autênticos de telecomunicações, miniaturas e vária documentação iconográfica, motivo pelo que consideramos uma exposição deste género, pela primeira vez patente ao público, bastante ilustrativa.

Enquadra-se a ação deste II conservador do museu no seguimento da ação do seu predecessor. No entanto a realização de Mora Ramos é mais notória sob o ponto de vista da integração na política museológica vigente, no que respeita aos valores corporativistas, ao passo que a ação do I conservador Mário Viana, se consubstanciou mais nos aspetos técnicos inerentes à refundação do museu, identificação e inventariação dos espécimes que haviam sido acumulados durante muitos anos sem quaisquer referências documentais. Terá sido um verdadeiro “quebra-cabeças” identificar e caraterizar objetos de que “já nem os velhos se lembravam”, como chegou a referir o professor Mário Viana na sua palestra sobre o museu (3).

Na circular nº 33/A de 1947, ano da nomeação de Mário Viana, sob o título Organização do Museu dos CTT podemos verificar o seguinte:

“Estando, presentemente, em organização activa o Museu dos CTT, no qual se devem recolher e catalogar, além de todo o material em uso, todos os aparelhos e utensílios antigos ou postos de parte susceptíveis de documentarem, de uma forma viva e expressiva, a múltipla e extensa actividade da nossa corporação, é de absoluta conveniência fazer recolher ao referido museu tudo quanto, de qualquer maneira, ofereça interesse para a história dos CTT em Portugal”. (4)

Já no Regulamento do Museu dos CTT publicado em ordem de Serviço nº 5501, 1, de Março de 1955 (5) (tempo do II conservador Mora Ramos) o ponto 2 da secção I faz especial referência a “O Valor Psico-Pedagógico de um Museu Profissional”, integrando-se na respetiva época do Estado Novo/Corporativo.

O texto da palestra é ilustrativo: “Trata-se não apenas de uma palestra, mas de mais uma das muitas dezenas de palestras que a Administração-Geral, ao serviço de uma constante política do espírito, já realizou”(6).

Estas declarações são indicativas do aproveitamento em termos sócio-político-ideológicos da ação estatal esperada pelo museu. Referindo-se aos novos funcionários, o conservador Mora Ramos diz que deveriam passar, aquando da admissão, por um estágio no museu, a fim de conhecerem o passado e o presente da “Casa” que iriam servir: “Interessa, sobretudo, que cada funcionário (…) veja e sinta que é um elo da cadeia, um pormenor indispensável no arranjo do conjunto. Interessa sobretudo, que encontre na grandeza da Administração o estímulo indispensável para levar avante o seu próprio trabalho, com entusiasmo, com dinamismo, com justificado orgulho!”[;] “Este Museu vivo que corresponde a uma necessidade da nossa época e da nossa Administração, este Museu que, se Deus quiser, permitirá criar uma colectiva consciência profissional” (7).
Do acima exposto e de outros postes relacionados, poderemos concluir que o atual Museu das Comunicações (herdeiro do Museu Postal, Museu dos CTT, Museu CTT das Comunicações e para-museus: dos TLP, CPRM – Companhia Portuguesa Rádio Marconi e Teledifusora de Portugal) está em condições de se reorganizar e ocupar um lugar de Museu Nacional (e na museologia nacional) de que este Portugal quase milenário, tanto carece para preservação eficaz dos Patrimónios de Comunicações e Transportes. Nenhum outro museu sectorial o poderá fazer com tanta pertinência e abrangência. Estes tempos de privatizações exigem-no. Deixar andar, assobiando para o lado, como se nada se passasse será incúria. Mais tarde “é sempre tarde de mais” como diz Pedro Abrunhosa num dos seus temas.

------------------------------------

Notas:

(1) RAMOS, António Mora – O Valor Psico-Pedagógico de um Museu Profissional. Lisboa: Ed. dos Serviços Culturais dos CTT, 1954, p. 18

(2) RAMOS, ob. cit. p. 19

(3) VIANA, Mário Gonçalves – Um Museu dos CTT: Objectivos – Organização – realização – Funcionamento. Lisboa: Ed. dos Serviços Culturais dos CTT, 1949, p. 58

(4) CTT Circular Nº 33/A de 1947, ano da nomeação de Mário Viana, sob o título Organização do Museu dos CTT

(5) Trata-se do primeiro regulamento formal do Museu dos CTT

(6) RAMOS, ob. cit., pp. 5-6

(7) RAMOS, ob cit., pp. 9-11

Fontes:

-ANCIÃES, Alfredo Ramos - O Museu dos CTT. Lisboa: Arquivo UNL, 1988/1989. Disponível também em Arquivo do Grupo dos Amigos do Museu das Comunicações.
 
-CTT Circular Nº 33/A - Organização do Museu dos CTT, 1947

-RAMOS, António Mora – O Valor Psico-Pedagógico de um Museu Profissional. Lisboa: Ed. dos Serviços Culturais dos CTT, 1954

-VIANA, Mário Gonçalves – Um Museu dos CTT: Objectivos – Organização – Realização – Funcionamento. Lisboa: Ed. dos Serviços Culturais dos CTT, 1949