“O esforço é grande e o
homem é pequeno [...]
A alma é divina e a obra é
imperfeita [... ]
E ao imenso e possível
oceano
Ensinam estas quinas
que [... ]
O mar sem fim é português” (34)
(Pensamento F. Pessoa, cf. nota supra)
Os
cabos telegráficos submarinos contribuiram para o desenvolvimento social,
não só pela razão da troca de notícias e mensagens, mas pelo lado desportivo,
cultural e recreativo que as equipas de técnicos cabotelegráficos
proporcionaram em Carcavelos e na Horta-Faial. Ingleses, alemães, americanos,
italianos, franceses e portugueses, entre outros, conviveram por via das
Estações Cabotelegráficas.
Estação
Cabotelegráfica de Carcavelos: Funcionou
durante mais de 90 anos (1870-1960`s). Começou a sua atividade com o cabo
Inglaterra (Porthurno onde também existe um dos raros museus telegráficos) -
Portugal (Carcavelos) e daqui até Gibraltar (domínio inglês) com o propósito de
se estender progressivamente ao Mediterrâneo, África e Oriente, destacando-se a
Índia (Goa e Bombaim); passando por Cabo Verde, Guiné, São Tomé, Angola e
Austrália.
No
auge da Revolução Industrial e na época vitoriana, a Inglaterra tinha, sozinha,
praticamente tanto poderio naval quanto o resto do mundo. Do ponto de vista das
comunicações telegráficas também dominavam os britânicos. Foram, contudo,
cedendo terreno aos americanos, alemães, portugueses, italianos e franceses.
Numa altura em que não havia internets
e a telefonia, por questões técnicas (35), tinha dificuldades em
atravessar os oceanos, as redes cabotelegráficas em código morse são
privilegiadas e chegam a quase todo o mundo.
Em
consequência, a comunidade britânica vem para a Quinta Nova de Santo
António de Carcavelos passando, a partir daí, a ser conhecida por Quinta dos
Ingleses. Nesta Quinta amarram cabos e instalam equipamentos de receção,
transmissão e retransmissão.
A
comunidade prima pelo nível técnico, cultural e desportivo, de modo que o nosso
rei dom Carlos, “bom vivant” e ilustre, vem fazer desporto à Quinta dos Ingleses.
Entre os desportos praticados e divulgados à sociedade portuguesa
refere-se: O ténis, ciclismo, bridge,
cricket e o “footeball”.
Em
1873/74 é a vez da Madeira se ligar ao continente europeu através de Carcavelos
e passa a comunicar também com Cabo Verde e Atlântico Sul, incluindo
o Brasil. A partir de 1893 entra em ação o importante ponto estratégico
dos Açores, especialmente a Estação Cabotelegráfica Intermédia da Horta
que proporciona a telegrafia elétrica morse entre a Europa e
consequentemente a posterior ligação à América do Norte: Canso - Canadá e
Manhattan Beach - Nova Iorque EUA.
Na
Quinta dos Ingleses é criada uma escola para servir a comunidade britânica. Com
a desativação da Estação de Carcavelos e dos obsoletos cabos
telegráficos, preserva-se o edifício, onde continua a escola bilingue
denominada St. Julian`s School
e uma área livre adjacente (36).
Estação
Cabotelegráfica da Horta:
Em cerca de 76 anos (1893-1969) de funcionamento, foram muitas as relações
entre os recursos humanos situados nesta Ilha do Atlântico, elevada a uma
espécie de centro do mundo (37). O facto dos técnicos estarem longe das suas
terras natais e permanecerem anos seguidos na Ilha, acaba por proporcionar
um reforço de comunicação com a população local. Assiste-se na Horta e Ilha do
Faial a relações de amizades, namoros e casamentos, aprendizagem de
línguas, novas práticas desportivas e editoriais (38) por causa da
Estação e junções telegráficas.
Na
relação cultural “[…] os
funcionários das companhias e as suas famílias faziam parte de um novo processo
através do qual o mundo estava cada vez mais interligado […] O cosmopolitismo
floresceu no Faial em espaços de convívio como o “Café Internacional, o Peter
Café Sport, British Sports Club, o grupo alemão Deutscher Sportvereein Horta, o
Comercial Sport Club, o Eastern Sport Club, o Western Union, instituições de
imprensa local, como O Telégrafo, e espaços culturais e de socialização da
Horta” (39).
A Europe
& Azores Telegraph Company, Limited e a Eastern Telegraph Company (inglesas), a CCC -
Commercial Cable Company, a WUTC- Wester Union Telegraph Company
(americanas), e a DAT – Deutsh Atlantiche Telegraphen Gesellscaft
(alemã), são as principais operadoras da rede de cabos na Horta
utilizando a Estação designada “Trinity
House” por via das três principais nacionalidades ali instaladas. Os
últimos serviços de telegrafia morse por cabo são desativados em 1969,
por causa da concorrência de novas tecnologias: cabos telefónicos com
regeneradores de sinais, pelos quais pode transitar simultâneamente a nova
telegrafia de tipo telex, alcançando grandes distâncias, entre continentes,
e sem necessidade da Estação Intermédia na Horta.
Desse
tempo ficaram marcas patrimoniais na Horta e memórias que o Museu local está a
recuperar e divulgar, dignificando um período de boas relações internacionais,
demonstrando que a convivência entre nações e a cidadania é possível e
desejável.
Fontes para VIII - Transmissões Telegráficas Submarinas e a Relação com o Desporto Cultura e Recreio em Carcavelos e Horta-Faial:
-ANCIÃES, Alfredo Ramos
------------–Património
museológico de telecomunicações: criação e gestão em contexto - Revista
Códice, nº 5, Ano XI, II Série, 2008
-------------Telegrafia
eléctrica - Revista Códice, nº 2, Ano VIII, II Série, 2005
-------------Cento
e cinquenta anos da telegrafia eléctrica em Portugal – Dossier de
Exposição, Fundação Portuguesa das Comunicações. Lisboa, 2005
-CARDOSO, Guilherme; MIRANDA, Jorge; TEIXEIRA, Carlos
A. - Registo fotográfico de Carcavelos e alguns apontamentos
histórico-administrativos. Cascais: Câmara Municipal de Cascais,
1988
-MUSEU da Horta; Associação dos Antigos Alunos do Liceu
da Horta - O Porto da Horta na
História do Atlântico: O Tempo
dos Cabos Submarinos – Ed. do A. Museu da Horta; Assoc. Antigos
Alunos do Liceu da Horta. Impressão: Gráfica O Telégrafo. Criação Gráfica:
JCS/Açores. Horta, 2011 ;
Em linha acedidas
em 28.3.2015:
-COSTA,
Ricardo Manuel – Breve Esboço sobre a História do Faial
- http://www.inventario.iacultura.pt/faial/horta/historia.html,
2007
-LEONARDO, A.J.F.; MARTINS, D.R.; FIOLHAIS, C. – A telegrafia eléctrica nas páginas de
“O Instituto”, 2009.
Disponível em https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/12323/1/A%20telegrafia.pdf,
acedido em 7.4.2014
-VARÃO, Isabel - Os Cabos Submarinos e a Expansão
da Telegrafia Internacional no Século XIX - Códice.
Revista
da Fundação Portuguesa das Comunicações.
Lisboa: FPC, 1998, p. 58-62
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