Com o 46º aniversário da
conquista da Democracia, apetece-me voltar ao tema dos direitos, liberdades e
responsabilidades.
Após a Revolução do 25 de Abril de 1974 Portugal
aprendeu com erros, anteriormente cometidos pelo Estado Liberal e I República.
Só para exemplos:
O Regime
de Abril não expulsa figuras ligadas às Igrejas;
No que
toca à promoção da participação nos poderes, nunca algum regime chegou tão
longe como o de Abril. -
Antes das Constituições liberais (1) os direitos das
populações à livre expressão e comunicação eram uma miragem.
(1)Os termos “liberal / liberalismo” têm, hoje em dia, uma carga muito
negativa. Contudo foi com o sistema liberal que os direitos dos cidadãos,
nomeadamente no que concerne à livre expressão ficaram garantidos em
Constituição. Contudo houve excessos de controlo a nível das Instituições
religiosas, afetando também a prática religiosa dos cidadãos, embora a primeira
Constituição liberal de 1822, consignasse no Título I “Dos direitos e deveres
individuais dos Portugueses”, no tocante a liberdade e dever de “venerar a
Religião” e “amar a Pátria”: “Todo o Português deve ser justo. Os seus
principais deveres são venerar a Religião; amar a Pátria; defendê-la com as
armas, quando for chamado pela lei; obedecer à Constituição e às leis;
respeitar as Autoridades públicas; e contribuir para as despesas do Estado”.
(Artigo 19º). Porém, não tardaria que as autoridades perseguissem
elementos do clero, fechando conventos e menosprezando a prática
religiosa. O mesmo foi seguido por autoridades da I República. Houve a
continuação de vexames, intimidações e perseguição ao clero e, por
consequência, aos praticantes católicos.
Sendo a escrita um monumento de comunicação quando direcionada para os direitos das populações; as
Constituições são, fora as
excepções, marcas de liberdades e garantias.
Para uma ligeira síntese destas marcas referimos aqui:
A CONSTITUIÇÃO DE 23 DE SETEMBRO DE 1822
No seu -
«Artigo 7º “A livre comunicação dos pensamentos é um dos mais preciosos
direitos do homem. Todo o Português pode conseguintemente, sem dependência de
censura prévia, manifestar suas opiniões em qualquer matéria, contanto que haja
de responder pelo abuso desta liberdade nos casos, e pela forma que a lei
determinar».
&&&
Passando à CARTA CONSTITUCIONAL DE 1826,
esta menos vantajosa, pois os direitos referentes à liberdade
de expressão passam, do princípio, para o final da Constituição. Assim no
«Título VIII – Das Disposições
Gerais, e Garantias dos Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Portugueses:
Artigo 145. A inviolabilidade
dos Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Portugueses, que tem por base a liberdade,
a segurança individual e a propriedade, é garantida pela Constituição do Reino,
pela maneira seguinte: § 3.° - Todos podem comunicar os seus pensamentos por
palavras, escritos, e publicados pela Imprensa sem dependência de Censura,
contanto que hajam de responder pelos abusos, que cometerem no exercício deste
direito, nos casos, e pela forma que a Lei determinar. § 4.° - Ninguém pode ser
perseguido por motivos de Religião, uma vez que respeite a do Estado, e não
ofenda a Moral Pública.»
Quanto à CONSTITUIÇÃO de 1838:
«Título III – Dos Direitos e Garantias dos
Portugueses
Artigo 13.º Todo o Cidadão pode comunicar
os seus pensamentos pela imprensa ou por qualquer outro modo, sem dependência
de censura prévia.
§ 1.° - A Lei regulará o exercício deste direito; e determinará o modo de
fazer efectiva a responsabilidade pelos abusos nele cometidos.
§ 2.° - Nos processos de Liberdade de Imprensa, o conhecimento do facto e a
qualificação do crime pertencerão exclusivamente aos Jurados.».
&&&
A letra
insuficiente das Constituições justifica o diálogo entre João Chagas e
Silva Graça, transmitido pelas Memórias de Raúl Brandão. Em relação ao
ponto a que a política chegara, nas vésperas da República:
«Estamos sobre um vulcão!
A audácia dos republicanos todos os dias aumenta:
Lisboa é nossa! - Exclama o Chagas.
- Se os Republicanos fizessem um comício no alto da avenida e viessem por
aí abaixo, a república estava feita! - afirma o Silva Graça.
- E o Porto e a Província?
- Perguntou ao Chagas.
- Que me importa a Província! Que me importa mesmo o Porto! - A república
fazemo-la [ou transmitimo-la] depois
pelo telégrafo.» (BRANDÃO, Memórias, 1919: 274).
Com a
revolução republicana nasce a CONSTITUIÇÃO DE 1911
No respeitante à expressão, comunicação, liberdades, igualdades e garantias,
esta Constituição institui no:
«Título II – Dos Direitos e Garantias Individuais:
Artigo 3.º A República Portuguesa não admite privilégio de nascimento, nem
foros de nobreza, extingue os títulos nobiliárquicos e de conselho e bem assim
as ordens honoríficas, com todas as suas prerrogativas e regalias;
Artigo 4.º A liberdade de consciência e de crença é inviolável.
Artigo 5.º O Estado reconhece a igualdade politica e civil de todos os
cultos e garante o seu exercício nos limites compatíveis com a ordem publica,
as leis e os bons costumes, desde que não ofendam os princípios do direito
publico português.
Artigo 6.º Ninguém pode ser perseguido por motivo de religião, nem
perguntado por autoridade alguma acerca da que professa.
Artigo 12º É mantida a legislação em vigor que extinguiu e dissolveu em
Portugal a Companhia do Jesus, as sociedades nela filiadas, qualquer que seja a
sua denominação, e todas as congregações religiosas e ordens monásticas, que
jamais serão admitidas em território português».
Neste Artigo verifica-se uma interferência da parte do
regime republicano ao extinguir a Companhia de Jesus e sociedades nela
filiadas, congregações religiosas e ordens monásticas; tanto assim que estas comunidades
voltaram posteriormente. Assim o“[...] jamais serão admitidos em território
português” tornou-se um `calcanhar de Aquiles` para I República. No
entanto, os três artigos seguintes trazem algum alívio:
«Artigo 13.º A expressão do pensamento, seja qual for a sua forma, é
completamente livre, sem dependência de caução, censura ou autorização prévia,
mas o abuso deste direito é punível nos casos e pela forma que a lei
determinar.
Artigo 14.º O direito de reunião e associação é livre. Leis especiais determinarão
a forma e condições do seu exercício.
Artigo 15.º É garantida a inviolabilidade do domicilio. De noite e sem
consentimento do cidadão, só se poderá entrar na casa deste a reclamação feita
de dentro ou para acudir a vitimas de crimes ou desastres; do dia, só nos casos
e pela forma que a lei determinar.»
&&&
Não obstante vários atropelos às liberdades, pelo Estado Novo, a CONSTITUIÇÃO
de1933 parecia generosa:
«Título II Dos Cidadãos:
Artigo 8º. Constituem direitos e garantias individuais dos cidadãos
portugueses [...]: 3º A liberdade e a inviolabilidade de crenças e práticas
religiosas, não podendo ninguém por causa delas ser perseguido, privado de um
direito, ou isento de qualquer obrigação ou dever cívico. 4º. A liberdade de
expressão do pensamento sob qualquer forma; 6º A inviolabilidade do domicílio e
o sigilo da correspondência, nos termos que a lei determinar; 14º A liberdade
de reunião e associação [...].
Artigo 20º. Haver revisão das sentenças criminais, assegurando-se o direito
de indemnização de perdas e danos pela fazenda Nacional, ao réu ou seus
herdeiros, mediante processo que a lei regulará. & 2º - Leis especiais
regularão o exercício da liberdade de expressão do pensamento, de ensino, de
reunião e de associação, devendo, quanto à primeira, impedir preventiva ou
repressivamente a perversão da opinião públicas na sua função de força social,
e salvaguardar a integridade moral dos cidadãos a quem ficará assegurado o
direito de fazer inserir gratuitamente a rectificação ou defesa na publicação
periódica em que forem injuriados ou infamados, sem prejuízo de qualquer outra
responsabilidade ou procedimento determinado na lei.
Título VI Da Opinião Pública.
Artigo 20º. A opinião pública é elemento fundamental da política e
administração do País, incumbindo ao Estado defendê-la de todos os factores que
a desorientem contra a verdade, a justiça, a boa administração e o bem comum.
& 2º. Leis especiais regularão o exercício da liberdade de expressão do
pensamento, de ensino, de reunião e de associação devendo, quanto à primeira,
impedir preventiva ou repressivamente a perversão da opinião públicas na sua
função de força social, e salvaguardar a integridade moral dos cidadãos, a quem
ficará assegurado o direito de fazer inserir gratuitamente a rectificação ou
defesa na publicação periódica em que foram injuriados ou infamados, sem prejuízo
de qualquer outra responsabilidade ou procedimento determinado na lei.
Artigo 21º. A imprensa exerce uma função de carácter público, por virtude
da qual não poderá recusar, em assuntos de interesse nacional, a inserção de
notas oficiosas de dimensões comuns que lhe sejam enviadas pelo Governo.
Título IX Da Educação, Ensino e Cultura Nacional
Artigo 43º & 3º - O ensino ministrado pelo Estado é independente de
qualquer culto religioso, não o devendo porém hostilizar, e visa, além do
revigoramento físico e do aperfeiçoamento das faculdades intelectuais, à
formação do carácter, do valor profissional e de todas as virtudes cívicas e
morais. & 4º - Não depende de autorização o ensino religioso nas escolas
particulares.»
&&&
Quanto à CONSTITUIÇÃO actualmente vigente:
Todos temos a noção dos
seus conteúdos, por isso remetemos, para quem estiver particularmente
interessado, para algumas fontes aqui indicadas.
Só uma nota final: Esta Constituição fundamentada na
Revolução de Abril de 1974 é a que mais detalhadamente garante as liberdades de
expressão e reunião. Os governos da Ditadura e do Estado Novo (1926 a 24 de
Abril de 1974) repuseram as liberdades religiosas, autorizando o regresso de
institutos e ordens mas cercearam outras liberdades de expressão e de
associação.
Fontes:
--BRANDÃO, Raúl – Memórias, 1919
Em linha, acedidas em 25.4.2020:
--ANCIÃES, Alfredo Ramos – “Portugal de Abril Comunicações Mil” http://cumpriraterra.blogspot.com/2015/04/40portugal-de-abril-comunicacoes-mil.html
--ANCIÃES, Alfredo Ramos – “ Portugal de
Abril: Comunicações
Liberdades e Responsabilidades Mil” https://cumpriraterra.blogspot.com/2017/04/150-portugal-de-abril-comunicacoes.html
--ANCIÃES, Alfredo Ramos – “ Portugal de Abril – Responsabilidades Mil”
--“PORTUGAL. Constituição de 23 de
Setembro de 1822” http://debates.parlamento.pt/Constituicoes_PDF/CRP-1822.pdf ;
--“PORTUGAL. Carta Constitucional de
1826” http://www.arqnet.pt/portal/portugal/liberalismo/c1826t8.html
--“PORTUGAL. Constituição de 1838” http://www.arqnet.pt/portal/portugal/liberalismo/c1838t3.html;
--“PORTUGAL Constituição de 1911” http://www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/Const_1911.pdf ;http://pt.wikipedia.org/wiki/Constitui%C3%A7%C3%A3o_portuguesa_de_1911;
--“PORTUGAL Constituição de 1933” http://debates.parlamento.pt/Constituicoes_PDF/CRP-1933.pdf
--“PORTUGAL Constituição da República
Portuguesa. VII Revisão Constitucional em 2005” in http://www.igfse.pt/upload/docs/2013/constpt2005.pdf
Legendas das
figuras anexas:
Imagens do arquivo pessoal AA:
-- 001 a 006 no Palácio de Sua Exª o Presidente da República de Portugal,
Belém – Lisboa;
-- 007 a 010 em Massamá, junto ao Parque Salgueiro Maia
Palavras-Chave: 25 de Abril, Constituição, direitos,
liberdades, garantias, História, Salgueiro Maia
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