terça-feira, 7 de outubro de 2014

15 MUSEU DOS CTT - FONTES E CONTRIBUTOS PARA UM FUTURO MUSEU NACIONAL DAS COMUNICAÇÕES


Refundação / Organização

 
O entusiasmo pela refundação do Museu dos CTT, outrora designado Museu Postal reflete-se em expressões utilizadas pelo I conservador - Mário Gonçalves Viana ao referir-se a um “apostolado museológico” como “uma das formas mais elevadas e mais necessárias do processo educativo contemporâneo” apontando Portugal como um país de “civilização universalista” (1).

Em relação ao museu que acabara de refundar, diz-nos que “Não será, apenas, para os funcionários, mas para todos – porque todos ali terão de aprender; apresentará o material e mostrará o trabalho da Corporação, será um museu erudito, um museu pedagógico, um museu profissional e um museu social […]” (2).

Este entusiamo deve-se ao perfil socioprofissional de Mário Viana, bem como à conjuntura política, favorável à criação de museus de caráter pedagógico do Estado Novo. Isso pode verificar-se, em relação à criação de uma rede de museus de etnografia. Nesta perspetiva: “Luís Chaves salienta a necessidade de existência de uma estrutura hierárquica culminando num Museu Nacional ou Central” (3).

O professor Coutinho Gouveia cita o investigador Luís Chaves destacando que “O essencial está na integração de todos os valores na grande obra da museografia nacional”. É de salientar que estas considerações datam de 1946 (4), um ano antes à refundação do Museu dos CTT. De relevar será ainda o facto dos Correios Telégrafos e Telefones naquele tempo constituírem um organismo estatal, integrado no Estado Corporativo, sujeito a interferências políticas e administrativas.

Na carreira de Mário Gonçalves Viana como conservador do museu interpôs-se uma alegada questão administrativa de acumulação de horas de serviço e vencimento no INEF – Instituto Nacional de Educação Física.

Mário Viana obtivera autorização prévia, quer em relação ao INEF, quer aos CTT. No entanto foi-lhe movido um processo pelo Estado Português que forçou o conservador a pedir a sua própria exoneração. Em resposta a pressões que lhe foram movidas escreve uma carta ao Diretor Geral dos CTT onde faz notar o seguinte: “Não me convindo continuar a servir a Administração Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones a partir do dia 20 de Janeiro peço a Vª Exª se digne conceder-me a exoneração do cargo de Conservador-Chefe do Museu”. Lisboa, 9 de Janeiro de 1952 e assina – Mário Gonçalves Viana. (5).

Não obstante todos os condicionalismos; em 1947, ano da posse de Mário Viana, encontramos cerca de 1500 registos de inventário, relativos a outros tantos objetos museológicos e foi preparada uma sede para o museu na Rua de S. Mamede ao Caldas, Lisboa.

Em 1949 publicou “Um Museu dos CTT: Objectivos – Organização – Realização – Funcionamento” constituindo um estudo de excecional qualidade para a época, que ainda é um marco da museologia.

Em 1951 começa a agudizar-se o problema acerca das horas e vencimento em regime de acumulação no INEF, até que um ofício do Ministério das Finanças, datado de 29.2.1952 refere o seguinte: “Tenho a honra de informar que o processo respeitante à acumulação pelo Dr. Mário Gonçalves Viana, dos cargos de professor contratado do INEF e de Chefe do Museu dessa Administração Geral dos CTT, foi arquivado em vista do interessado já não exercer qualquer destes lugares e a sua situação quanto ao abono de remunerações durante o período em que os acumulou, dever considerar-se regularizada em face do estabelecido no despacho da Presidência do Conselho transmitido na circular nº 159, série A, de 16 de Fevereiro corrente [1952]”(6).

Tudo parece indicar que muitas das realizações deste conservador não foram registadas em relatórios de gestão, ou se o foram, acabaram por se perder; no entanto podemos inferir pela transcrição que a seguir citamos, das dificuldades encontradas e que refletem a difícil prática museológica dos anos 40 e 50:

“A maioria das pessoas não avalia o trabalho delicado e insano, o trabalho inglório e obscuro, que há a realizar, quando se cria um museu, para selecionar, classificar, agrupar e catalogar milhares de objectos. Para organizar as colecções e ficheiros; para identificar numerosos espécimes, de que só os “velhos” se lembram […]. Para reconstituir objectos ou aparelhos incompletos […] para completar as séries […] colher os necessários elementos informativos […] para vigiar sem descanso pela conservação […] vencer as incompreensões que em vão se solicitam […] muitas vezes para se conseguir alguma coisa, há que pedir e suplicar quase […] como quem pede uma esmola […]” (7).

Notas

(1) VIANA, Mário Gonçalves – Um Museu dos CTT: Objectivos – Organização – Realização – Funcionamento. Lisboa: Ed. dos Serviços Culturais dos CTT, 1949, p. 15

(2) Idem, p. 41

(3) GOUVEIA, Henrique Coutinho – “Acerca do conceito e evolução dos Museus Regionais Portugueses, desde finais do século XIX ao Regime do Estado Novo”, in Bibliotecas Arquivos e Museus, vol. 1, jan. / jun., 1985, p 176

(4) CHAVES, Luís – O Museu de Etnografia e História do Douro Litoral. Lisboa: Ed. Ocidente, vol. XXVIII, 1946

(5) CTT - Pedido de exoneração, in processo individual no Arquivo de Registo Biográfico.

(6) CTT - Ofício in processo individual no Arquivo de Registo Biográfico.

(7) VIANA, Mário Gonçalves – Um Museu dos CTT, ob. cit. pp 58-59


Postado inicialmente: quinta-feira, 14 de agosto de 2014 11:26 por Alfredo Ramos Anciães no blogue:
P. S. A plataforma de blogues da comunidade http://comunidade.sol.pt/ tem estado indisponível desde Setembro 2014, até … Desta forma resolvemos recuperar uma cópia que tínhamos do poste em referência e editá-la nesta plataforma blogspot.pt .
 

5 comentários:

  1. Caro Fred, ficou uma grande lição grade lição, sobre dificuldades e métodos de se organizar museologia. Os nomes de que falas, já não são do meu tempo, nem aparecem no que já li a propósito (literatura filatélica).
    Sobre a comunidade sol, estou em julgar que terá acabado de vez. Ainda bem passei para os meus blogges no Blogspot, de aqui tens acesso.
    Deixo um abraço

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  2. Olá caro Daniel.

    Espero que a comunidade Sol ainda volte a funcionar, pois tenho lá muito conteúdo editado. O setor privado é assim, nunca podemos ter confiança total, pois o lucro é a razão primordial de existir, o resto interessa pouco.

    Irei visitar-te no teu blogue. Obrigado também pelas tuas palavras.

    Abraço

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  3. Uma boa lição sobre museologia.

    Um abraço amigo.

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  4. Obrigado caro Jorge.

    Acrescento que ao obra do conservador VIANA, Mário Gonçalves

    – Um Museu dos CTT: Objectivos – Organização – Realização – Funcionamento. Lisboa: Ed. dos Serviços Culturais dos CTT -

    foi objeto de publicação em várias línguas, incluindo o árabe. Contudo a museologia portuguesa não lhe tem dado o merecido reconhecimento e destaque, bem como ao próprio autor que publicou várias dezenas de livros sobretudo de psicologia e que, em meu entender, também não têm sido divulgadas na medida da sua qualidade.

    Haverá, sim, quem delas se tenha aproveitado sem a devida citação.

    Um abraço.

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  5. Parabéns, caro Alfredo Ramos Anciães, pelo excelente artigo sobre o Museu dos C T T, integrado na Fundação Portuguesa das Comunicações, e que pelo grande interesse a nível postal, cultural, histórico histórico e didático não podia ficar indiferente. Respeitosos cumprimentos.

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