Refundação
/ Organização
O entusiasmo pela
refundação do Museu dos CTT, outrora designado Museu Postal reflete-se em expressões
utilizadas pelo I conservador - Mário Gonçalves Viana ao referir-se a um
“apostolado museológico” como “uma das formas mais elevadas e mais necessárias
do processo educativo contemporâneo” apontando Portugal como um país de
“civilização universalista” (1).
Em relação ao museu
que acabara de refundar, diz-nos que “Não será, apenas, para os funcionários,
mas para todos – porque todos ali terão de aprender; apresentará o material e
mostrará o trabalho da Corporação, será um museu erudito, um museu pedagógico,
um museu profissional e um museu social […]” (2).
Este entusiamo
deve-se ao perfil socioprofissional de Mário Viana, bem como à conjuntura
política, favorável à criação de museus de caráter pedagógico do Estado Novo.
Isso pode verificar-se, em relação à criação de uma rede de museus de
etnografia. Nesta perspetiva: “Luís Chaves salienta a necessidade de existência
de uma estrutura hierárquica culminando num Museu Nacional ou Central” (3).
O professor
Coutinho Gouveia cita o investigador Luís Chaves destacando que “O essencial
está na integração de todos os valores na grande obra da museografia nacional”.
É de salientar que estas considerações datam de 1946 (4), um ano antes à
refundação do Museu dos CTT. De relevar será ainda o facto dos Correios
Telégrafos e Telefones naquele tempo constituírem um organismo estatal,
integrado no Estado Corporativo, sujeito a interferências políticas e
administrativas.
Na carreira de
Mário Gonçalves Viana como conservador do museu interpôs-se uma alegada questão
administrativa de acumulação de horas de serviço e vencimento no INEF –
Instituto Nacional de Educação Física.
Mário Viana
obtivera autorização prévia, quer em relação ao INEF, quer aos CTT. No entanto
foi-lhe movido um processo pelo Estado Português que forçou o conservador a
pedir a sua própria exoneração. Em resposta a pressões que lhe foram movidas
escreve uma carta ao Diretor Geral dos CTT onde faz notar o seguinte: “Não me
convindo continuar a servir a Administração Geral dos Correios, Telégrafos e
Telefones a partir do dia 20 de Janeiro peço a Vª Exª se digne conceder-me a
exoneração do cargo de Conservador-Chefe do Museu”. Lisboa, 9 de Janeiro de
1952 e assina – Mário Gonçalves Viana. (5).
Não obstante todos
os condicionalismos; em 1947, ano da posse de Mário Viana, encontramos cerca de
1500 registos de inventário, relativos a outros tantos objetos museológicos e
foi preparada uma sede para o museu na Rua de S. Mamede ao Caldas, Lisboa.
Em 1949 publicou
“Um Museu dos CTT: Objectivos – Organização – Realização – Funcionamento”
constituindo um estudo de excecional qualidade para a época, que ainda é um
marco da museologia.
Em 1951 começa a
agudizar-se o problema acerca das horas e vencimento em regime de acumulação no
INEF, até que um ofício do Ministério das Finanças, datado de 29.2.1952 refere
o seguinte: “Tenho a honra de informar que o processo respeitante à acumulação
pelo Dr. Mário Gonçalves Viana, dos cargos de professor contratado do INEF e de
Chefe do Museu dessa Administração Geral dos CTT, foi arquivado em vista do
interessado já não exercer qualquer destes lugares e a sua situação quanto ao
abono de remunerações durante o período em que os acumulou, dever considerar-se
regularizada em face do estabelecido no despacho da Presidência do Conselho
transmitido na circular nº 159, série A, de 16 de Fevereiro corrente
[1952]”(6).
Tudo parece indicar
que muitas das realizações deste conservador não foram registadas em relatórios
de gestão, ou se o foram, acabaram por se perder; no entanto podemos inferir
pela transcrição que a seguir citamos, das dificuldades encontradas e que
refletem a difícil prática museológica dos anos 40 e 50:
“A maioria das
pessoas não avalia o trabalho delicado e insano, o trabalho inglório e obscuro,
que há a realizar, quando se cria um museu, para selecionar, classificar,
agrupar e catalogar milhares de objectos. Para organizar as colecções e
ficheiros; para identificar numerosos espécimes, de que só os “velhos” se
lembram […]. Para reconstituir objectos ou aparelhos incompletos […] para
completar as séries […] colher os necessários elementos informativos […] para
vigiar sem descanso pela conservação […] vencer as incompreensões que em vão se
solicitam […] muitas vezes para se conseguir alguma coisa, há que pedir e
suplicar quase […] como quem pede uma esmola […]” (7).
Notas
(1) VIANA, Mário Gonçalves – Um Museu dos CTT:
Objectivos – Organização – Realização – Funcionamento. Lisboa: Ed. dos Serviços
Culturais dos CTT, 1949, p. 15
(2) Idem, p. 41
(3) GOUVEIA, Henrique Coutinho – “Acerca do conceito e
evolução dos Museus Regionais Portugueses, desde finais do século XIX ao Regime
do Estado Novo”, in Bibliotecas Arquivos e Museus, vol. 1, jan. / jun., 1985, p
176
(4) CHAVES, Luís – O Museu de Etnografia e História do
Douro Litoral. Lisboa: Ed. Ocidente, vol. XXVIII, 1946
(5) CTT - Pedido de exoneração, in processo individual
no Arquivo de Registo Biográfico.
(6) CTT - Ofício in
processo individual no Arquivo de Registo Biográfico.
(7) VIANA, Mário Gonçalves – Um Museu dos CTT, ob. cit.
pp 58-59
Postado inicialmente: quinta-feira, 14 de agosto de 2014 11:26 por Alfredo Ramos Anciães no blogue:
P. S. A plataforma de blogues da comunidade http://comunidade.sol.pt/ tem estado indisponível desde Setembro 2014, até … Desta forma resolvemos recuperar uma cópia que tínhamos do poste em referência e editá-la nesta plataforma blogspot.pt .
Postado inicialmente: quinta-feira, 14 de agosto de 2014 11:26 por Alfredo Ramos Anciães no blogue:
P. S. A plataforma de blogues da comunidade http://comunidade.sol.pt/ tem estado indisponível desde Setembro 2014, até … Desta forma resolvemos recuperar uma cópia que tínhamos do poste em referência e editá-la nesta plataforma blogspot.pt .
Caro Fred, ficou uma grande lição grade lição, sobre dificuldades e métodos de se organizar museologia. Os nomes de que falas, já não são do meu tempo, nem aparecem no que já li a propósito (literatura filatélica).
ResponderEliminarSobre a comunidade sol, estou em julgar que terá acabado de vez. Ainda bem passei para os meus blogges no Blogspot, de aqui tens acesso.
Deixo um abraço
Olá caro Daniel.
ResponderEliminarEspero que a comunidade Sol ainda volte a funcionar, pois tenho lá muito conteúdo editado. O setor privado é assim, nunca podemos ter confiança total, pois o lucro é a razão primordial de existir, o resto interessa pouco.
Irei visitar-te no teu blogue. Obrigado também pelas tuas palavras.
Abraço
Uma boa lição sobre museologia.
ResponderEliminarUm abraço amigo.
Obrigado caro Jorge.
ResponderEliminarAcrescento que ao obra do conservador VIANA, Mário Gonçalves
– Um Museu dos CTT: Objectivos – Organização – Realização – Funcionamento. Lisboa: Ed. dos Serviços Culturais dos CTT -
foi objeto de publicação em várias línguas, incluindo o árabe. Contudo a museologia portuguesa não lhe tem dado o merecido reconhecimento e destaque, bem como ao próprio autor que publicou várias dezenas de livros sobretudo de psicologia e que, em meu entender, também não têm sido divulgadas na medida da sua qualidade.
Haverá, sim, quem delas se tenha aproveitado sem a devida citação.
Um abraço.
Parabéns, caro Alfredo Ramos Anciães, pelo excelente artigo sobre o Museu dos C T T, integrado na Fundação Portuguesa das Comunicações, e que pelo grande interesse a nível postal, cultural, histórico histórico e didático não podia ficar indiferente. Respeitosos cumprimentos.
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