“Nem a aridez da Ciência Antropológica, nem as flores da Literatura. O [...] objectivo é diferente: É de uma natureza mais positiva; tende a facilitar a comunicação entre os povos e a transportar o pensamento escrito de um canto do Mundo ao outro” (extrato traduzido do francês proferido pelo rei D. Luís no Congresso da União Postal Universal, reunido em Lisboa no dia 11 de fevereiro de 1885)
Nota prévia: Não temos indicação de que os patrimónios de correios, telecomunicações e filatelia estejam a ser geridos com falta de zelo. No entanto convém acautelar sobre os eventuais perigos que ligam estes acervos a privatizações.
O conhecimento que nos chega informalmente de Inglaterra, em situações semelhantes, deixa-nos apreensivos. Estão em causa peças dos CTT e PT e a breve trecho poderá ser a vez da TAP, RTP (Rádio e Televisão). Deixamos aqui um alerta sobre as incertezas em relação ao espólio museológico e documental e, simultaneamente, indicamos vantagens em preservar e gerir estes valores num museu nacional.
Portugal tem patrimónios que refletem o quanto interagimos com outros povos, desde o século XV. As memórias dão-nos alma, identidade e possibilidade de realizar valor económico, tratando estes acervos como recursos. Estamos a pensar em patrimónios tangíveis e intangíveis dos CTT, PT, ANACOM e FPC - Fundação Portuguesa das Comunicações, entre outros da área das comunicações e dos transportes afins. Em termos históricos referimo-nos também aos acervos de telecomunicações das ex-empresas integradas na PT: TLP – Telefones de Lisboa e Porto, CPRM – Companhia Portuguesa Rádio Marconi e TDT – Teledifusora de Portugal (1). Estes acervos museológicos prevalecem à guarda na Fundação Portuguesa das Comunicações.
Sendo o turismo, uma das nossas atividades mais lucrativas, faz sentido criar um museu nacional das comunicações. Além de peças originais poderá usar réplicas. Exemplo a “Carta de Pero Vaz de Caminha” sobre o descobrimento ou achamento do Brasil e os primeiros contactos com novas terras, populações e culturas. Faria sentido que esta Carta estivesse em exposição permanente, ou de longa duração, em contexto das comunicações, transportes e descobertas.
O Museu das Comunicações, Museu dos Transportes e Comunicações, Museu Nacional da Imprensa, Museu do Cabo Submarino, Arquivo do Ultramar, Biblioteca Nacional de Portugal, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Embaixadas, Ministério dos Negócios Estrangeiros, Museu de Marinha, Museu Maynense, Museu da Medicina - são alguns exemplos com preciosas peças de comunicação e descobertas que poderão alimentar exposições temporárias e de longo prazo num futuro museu nacional das comunicações transportes e descobertas e, enquanto isso não puder acontecer, que seja ativada uma rede de patrimónios afins.
Recorrendo às novas museologias, podemos expor ideias e conceitos, materializar o imaterial ou o que já não existe, concebendo/construindo peças que visualizem, por exemplo, as primeiras trocas e comunicações de Portugal com vários povos do mundo. Estas relações constituem atos de comunicação; logo, é pertinente alargar o âmbito de ação para dar mais força e visibilidade às peças museológicas, atrair mais públicos e justificar investimentos.
Será a oportunidade para Portugal ter o merecido, necessário e há muito aguardado museu com as temáticas da história, descobertas, encontros e relações com vários povos. Neste museu poderão participar, só para exemplo, nomes portugueses nossos conhecidos e revisitados, tais como:
- Cristiano Bramão (inovador na telegrafia e telefonia), Maximiliano Herrmann (inovador e construtor na telegrafia, telefonia, caminhos de ferro e eletrificação); Guilhermino Augusto de Barros (político e diretor da Direção Geral dos Correios Telégrafos e Faróis); Godofredo Ferreira (autor, compilador e organizador de documentação da história dos correios e telecomunicações); Gago Coutinho (cientista, inovador, cartógrafo, navegador e pioneiro na 1ª viagem aérea de Portugal ao Atlântico Sul); Sacadura Cabral (cartógrafo e aviador, colaborou na 1ª viagem aérea de Portugal ao Atlântico Sul);
- Mas também outros portugueses e do espaço lusófono que investigaram, descobriram, inventaram, organizaram, comunicaram e se destacaram, tais como:
- D. Dinis (rei poeta, impulsionador da marinha, letras e instituidor da língua portuguesa com que Portugal passou a comunicar oficialmente); Infante D. Henrique (o impulsionador das descobertas e comunicações com povos de além-mar); Vasco da Gama (pioneiro no Oriente por via marítima); Pedro Álvares Cabral (navegador, descobridor, iniciador das relações entre povos brasílicos e portugueses); Fernão de Magalhães (pioneiro na primeira viagem de circum-navegação);
Fernão Vaz Dourado (na cartografia mundial); Garcia de Horta (nas descobertas e experimentalismo renascentista europeu); Marquês de Pombal (na ciência, educação, relações externas e expansão do Brasil); Luís de Camões (vida e obra); Afonso de Albuquerque (na Ásia, nos casamentos mistos, na vastidão do mar português e na diplomacia); Alexandre Rodrigues Ferreira (na ciência, comunicação e “viagem filosófica” ao interior do Brasil);
Domingos Vandelli (italiano que fez de Portugal a sua segunda Pátria, colaborou na ciência e no ensino); frei José Mayne (na ciência, religião, filosofia e ensino); frei Manuel do Cenáculo (na “biblioteca nacional”, ciência, arqueologia e defesa do património); António Raposo Tavares (“último grande bandeirante”, o conhecimento e a expansão do Brasil); D. Pedro IV de Portugal e I Imperador do Brasil (proporcionou a continuação das relações/comunicações e a lusofonia); Fernando Pessoa (vida e obra, especialmente o contributo para a cultura da língua portuguesa); Aristides de Sousa Mendes (direitos humanos, comunicação, diplomacia e cidadania), Egas Moniz (comunicações e desenvolvimento da medicina neurológica), Rómulo Vasco da Gama de Carvalho (2) .... ;
Mais recentemente Eusébio da Silva Ferreira e Cristiano Ronaldo, ambos fenómenos da cultura moderna – o futebol que implica a comunicação de massas e entre vários povos do mundo.
Acreditamos que a cooperação de museus, núcleos, arquivos e bibliotecas com o Museu das Comunicações reorganizado (3) em Museu Nacional, ou nele colaborante, será uma mais valia para a imagem e a economia de Portugal.
Notas:
(1) Teledifusora de Portugal. Organização anteriormente gerida pela RTP para a difusão do sinal de televisão. Transitou há pouco mais de uma década para a PT. (2) Rómulo de Carvalho (conhecido pelo pseudónimo António Gedeão) organizou o Museu Maynense da Academia de Ciências de Lisboa e sintetizou, no seu poema “Pedra Filosofal”, a ciência, técnica, arte, descobrimento(s), viagem e comunicação.
(3) Um velho e experiente gestor de patrimónios de interesse público dizia que “Os Museus renovam-se, transformam-se e modernizam-se ao serviço das suas coleções e do público que servem” (Les Musées se renovent, se transforment, se modernisent au servisse de leurs colections, au servisse du public qu`ils tentent de séduire” – Landais, Hubert – Directeur des Musées de France in Faire un Musée: Comment Conduire une Operation Museographique? – Paris: La Documentation Française, 1986
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